segunda-feira, 13 de abril de 2009

Não! A Comuna não está morta.

Este artigo foi escrito e publicado no "Registo" de 13 de Abril. Contudo, porque tenho a nitida noção que foi enviado para as páginas finais do jornal, quer por não ter sido inteiramente compreendido pelos responsáveis, quer porque quem lê títulos não lê interiores, deixo aos eventuais leitores do blog a sua transcrição na integra.




Durante anos, especialmente após a segunda guerra mundial, os governos dos EUA e da Europa ocidental pensaram que terciarizando a economia e deslocalizando as industrias extractivas e transformadoras para países subdesenvolvidos, criavam as condições para a alteração das classes sociais, até um ponto em que, como se acreditou durante algum tempo, a luta de classes teria acabado, bem como a ligação das populações aos partidos ideológicos, especialmente aqueles ligados à emancipação do operariado, ou seja, aqueles que ideologicamente se assumiam como herdeiros da Comuna de Paris. Contudo esqueceram e esquecem, que este fenómeno, que é o próprio motor da história, não se perde, nem se cria, apenas se transforma ao longo do processo.
Ao terciarizar a economia, o que fizeram também foi empregar nesse sector maioria da força de trabalho, pelo menos aquela que possuía formação para tal, força de trabalho essa que não passou a ser dona da sua ferramenta de produção, logo que está a alienar o seu trabalho para sobreviver. Acontece que esta é exactamente a condição do proletário. Daí que o que foi realmente consumado foi a proletarização do trabalho terciário.
Sendo verdade que esta classe não tem hoje consciência da sua situação, a evolução das condições em que trabalha e das vicissitudes que enfrenta, torná-la-ão progressivamente mais reivindicativa e exigente, acabando por a aproximar desses mesmos partidos, dos quais tanto esforço foi feito para afastar.
O fenómeno da expansão do consumo e do acesso ao crédito, que vinham sendo tentados desde os anos trinta mas, que tiveram a sua exponencial no início dos anos sessenta, não só significava uma capacidade acrescida de acumulação de capital, mas servia também a propaganda de um modelo social que afirmava que o conforto e mesmo o excesso eram frutos naturais da economia capitalista a obter sem grande esforço, com a óbvia vantagem de amarrar os trabalhadores e as várias faixas etárias ao pagamento a prazo desses bens e serviços, alienando-os da reivindicação de direitos, através da sujeição a condições de trabalho cada vez mais duras, precárias, disfarçadas de maior mobilidade de emprego e flexibilização de oportunidades, abrigadas por uma robusta e eficaz segurança social, que se mostrou um logro tão grande, quanto as próprias facilidades de aquisição de bens.
O falhanço do modelo económico e social baseado nestes pressupostos, à escala mundial, revelou de forma cabal que as necessidades de salários mais justos no momento, e não a venda de trabalho ainda não realizado, e o fortalecimento dos sistemas produtivos, em detrimento da especulação sobre produções inexistentes ou de muito duvidosa existência, era a única forma de garantir paulatina, mas solidamente a satisfação de justas aspirações, como a casa, a saúde, o ensino ou a qualidade de vida. E que a reivindicação dessa classe que se viu de um momento para o outro privada de um nível de vida, que julgava garantido, mas que na forma como o estava era insustentável*, não é senão a manifestação concreta da luta de classes.
Em última análise é a própria dinâmica da luta de classes a determinar a ligação dos partidos Comunistas à população, por representarem a resposta a um conjunto de questões assinaláveis, e não uma resposta eleitoral baseada em casuísmos ou causas desgarradas. Estas podem ter um atractivo imediato, acompanhado por um sucesso tão explosivo quanto efémero, mas no fim será sempre o conjunto de respostas e propostas coerentes, que visam a transformação, que terá a última palavra. De facto a Comuna não morreu.


(*entenda-se por depender do endividamento sucessivo dos trabalhadores e não pela justa districbuição da riqueza gerada)

1 comentário:

Leão disse...

Pois é amigo, a liberdade de imprensa existe mas só para alguns ou para algumas escritas que não vão contra os interesses de quem dirige os Regiistos . Abração e continuação do que o poeta dizia : " Não há machado que corte a raiz ao pensamento ..."
Leão.