quarta-feira, 30 de junho de 2010

Não temos nada para entender

Este texto foi escrito originalmente para o Registo, porem não foi, mais uma vez, publicado



Há alguns dias atrás uma personagem, que não conheço e que espero nunca vir a conhecer mas que é com certeza personagem lida e ouvida pelos meios académicos, empresariais e jornalísticos, afirmava, num respeitado jornal dedicado às matérias económicas, que os portugueses tinham de entender que férias pagas, saúde e educação universais, não eram direitos para sempre.
Suponho que juntamente com esses direitos o autor do artigo entenderia também que não são direitos o subsídio de desemprego, de aleitação, a licença de maternidade, e várias outras regalias que esses malandros dos trabalhadores usufruem e que os faz recusarem-se a ser paus para toda a obra, na hora e local que o seu patrão quiser, e mostrarem-se ainda agradecidos pelas migalhas para comer.
Esquece-se, esta alma clarividente, que descontos, impostos e contribuições, são os deveres que há muito estão associados a esses direitos. Na sociedade em que vivemos tudo é pago, até aquilo que recebemos antes de sair de férias, ou quando desempregados, foi já pago pelo nosso trabalho. Donde enquanto descontarmos não estamos a receber favor qualquer, pelo qual tenhamos de compreender a sua cessação.
O que estes senhores querem é o fim destas prestações sociais sem o fim das contribuições que lhes dão substância. Ou seja, os trabalhadores continuariam a pagar e contribuir, mas sem receber o que quer que fosse em troca. Em seu lugar, os banqueiros teriam à sua disposição, mais fundos para poderem prosseguir as suas actividades. Algo como: Nós pagamos e eles recebem alegremente.
Como se já não chegasse o desequilíbrio da riqueza nacional em detrimento dos trabalhadores, o que faz do nosso país, um dos mais desiguais de toda a União Europeia, estas inteligências raras acham ainda que ninguém repara que estão a propor o roubo puro e simples como forma de vencer a crise.
Se nós entrarmos nos seus bancos de arma em punho, eles chamam a polícia. Se nós clonarmos os seus cartões ou contas, estamos à perna com crime de fraude. Mas se eles se apropriam do que nós descontamos, se eles acumulam salários e pensões, se eles recebem créditos ilimitados, bónus, carros de empresa, motoristas, etc., etc., tudo recebe o nome de, Economia de Mercado.
Dizia, sem errar muito, um comentador muito em voga que o Sistema Social Europeu foi uma criação rapidamente abraçada perante o “perigo soviético”. Acontece que se o tal do perigo desapareceu, isso não significa que o desejo das populações por uma sociedade mais justa tenha perecido com a URSS. Donde a ideia que uma vez ganha a Guerra Fria se podem atirar aos trabalhadores como gato ao bofe, é uma concepção que só pode passar pela cabeça de gente que dedicou a sua vida a promover a deseducação e acabar com o espírito crítico.
Não somos nós que temos de compreender nada, porque a compreender aqui só existe o facto de o rendimento obtido do trabalho e dos descontos realizados sobre esses rendimentos não servirão a mais nada do que a melhorar as condições de vida de quem os recebeu e descontou, dos seus filhos e dos seus dependentes. Se não entendem eu faço um desenho!

terça-feira, 29 de junho de 2010

Por quanto tempo mais?






















As fotografias que coloquei neste post dizem respeito ao projecto Ausências, levado a cabo por um fotógrafo argentino, em que recria a pose de fotos do passado, em que faltam os desaparecidos da ditadura fascista argentina. A ditadura argentina foi tolerada e até mesmo apoiada por inúmeras respeitáveis democracias e respectivos responsáveis, durante anos. A justiça destes ausentes, que não estão apenas mortos mas desaparecidos, está ainda por fazer. Os seus algozes gozam de imunidades e cumplicidades que impedem a justiça.

O filme que aqui coloco é ao mesmo tempo mais antigo e mais recente. Mais antigo porque a história destes desaparecidos, que se conta da mesma forma, aconteceu muitos anos antes. Mais recente, porque ainda agora os crimes do franquismo permanecem calados, sem justíça, sem um serviço funebre ou um local de enterro que honre estes homens e mulheres. Continuam assim sem história, jazendo algures, sem que os seus familiares saibam onde.

Este filme existe, porque há quem pense hoje que se pode fingir que não existem. Porque há quem hoje que continua sendo cumplice destes crimes e que os não queira ver divulgados por poderem por em risco os propósitos que defendem e que são fruto, em Espanha, da imposição do levantamento de 18 de Julho.


sexta-feira, 25 de junho de 2010

As Palavras e os murmúrios

Este artigo foi escrito para o Registo, mais uma vez parece que "entenderam" não ter qualidade necessárias para este jornal.

O Mês de Junho parece ser pródigo no desaparecimento de personalidades dedicadas à alteração da condição humana e ao aparecimento de uma sociedade em que não se meçam mais os homens pelo quanto têm, mas pelo que são capazes de partilhar com os outros seres.
José Saramago, tal como Álvaro Cunhal, Vasco Gonçalves ou Rosa Coutinho, foi uma dessas personalidades que, tal como os outros, nos deixou num mês de Junho. Deixou-nos, mas legou-nos uma obra que ultrapassa em muito o seu valor literário, que já era imenso. É claro que é importante relembrar os galardões que conquistou graças aos seus escritos, mas mais importante do que isso é o que a sua obra e vida, ensinam, esclarecem e inspiram, da capacidade do homem e dos homens ultrapassarem os limites que as condições históricas e sociais lhes impuseram, libertarem-se das amarras da ignorância e desconhecimento e contribuírem para a construção de um mundo que, para muitos de nós se queda no campo da utopia ou do sonho.
Para todos os caídos as letras impressas das suas palavras deram alento a que do chão se levantassem. A todos os desconhecidos da história devolveu a dignidade das obras que por sua mão e esforço construíram. A todos os cegos outorgou a luz de ler e interpretar um momento histórico e social que se desenrola diante de si. E a todos os nomes devolveu a graciosidade da vida, momento, e sentimento que a cada um cabe no todo humano. Este prémio, o prémio do amor e dedicação ao seu semelhante são certamente o prémio a que mais se dedicou e que mais o prestigiou no seu trajecto pela vida.
O silêncio, dizia, é a terra negra e fértil, o húmus do ser, donde todo o silêncio que façamos neste momento só pode ser fecundo, pois só assim, segundo ele, a palavra dá pão. Mas silêncio não significa que não ouçamos os murmúrios, os murmúrios que soam mas que se escondem, e que procuram, como antes procuraram, matar antes que nasça, a palavra, apodrecer antes que medre, o grão, que se perca antes de moída, a farinha, e que desta não se faça o pão do sonho e do futuro.
Se o silêncio é a terra e a palavra a semente, exterminemos a praga do murmúrio, que cresça o verbo como trigo e que a ceifa seja pródiga, e que de um pão, surjam cem, surjam mil surja um milhão, que alimente de vontade, de esperança e vigor de luta a humanidade e do sonho se faça nova construção.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Sobre o falecimento de José Saramago - Nota do Secretariado do Comité Central

Num momento em que o País perde um dos seus máximos expoentes literários e o Mundo perde um exemplo de humanismo e dedicação à causa de levantar do chão a humanidade enquanto um todo, deixo a transcrição da Nota do Secretariado do Comité Central do PCP, partido em que José Saramago militou desde 1969.



Sobre o falecimento de José Saramago
Nota do Secretariado do Comité Central
Lisboa, 18 de Junho de 2010


A morte de José Saramago constitui uma perda irreparável para Portugal, para o povo português, para a cultura portuguesa.

A dimensão intelectual, artística, humana, cívica, de José Saramago fazem dele uma figura maior da nossa História.

A sua vasta, notável e singular obra literária – reconhecida com a atribuição, em 1998, do Prémio Nobel da Literatura - ficará como marca impressiva na História da Literatura Portuguesa, da qual ele é um dos nomes mais relevantes.

Construtor de Abril, enquanto interveniente activo na resistência ao fascismo, ele deu continuidade a essa intervenção no período posterior ao Dia da Liberdade como protagonista do processo revolucionário que viria a transformar profunda e positivamente o nosso País com a construção de uma democracia que tinha como referência primeira a defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País.

José Saramago era militante do Partido Comunista Português desde 1969 e a sua morte constitui uma perda para todo o colectivo partidário comunista - para o Partido que ele quis que fosse o seu até ao fim da sua vida.

O Secretariado do Comité Central do PCP manifesta o seu profundo pesar, a sua enorme mágoa pela morte do camarada José Saramago – e expressa as suas sentidas condolências à sua companheira, Pilar del Rio, e restante família.


O Secretariado do Comité Central do Partido Comunista Português



quinta-feira, 17 de junho de 2010

Que ninguém se cale!



Artigo publicado no jornal Registo

A Constituição da República Portuguesa garante que: “ Todos têm o direito de exprimir e divulgar o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como de se informar e ser informados, sem impedimentos ou discriminações”. Garante também que: “O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo de ou forma de censura”. Garante ainda que: “A liberdade de imprensa implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores…”


Todos sabemos como a nossa constituição tem sido mal tratada e sabemos mais ainda que não tem sido respeitada, até com o beneplácito daqueles que deveriam ser os seus mais fiéis guardiões. Todos conhecemos que a coberto do chamado “interesse jornalístico” se têm omitido, escamoteado, e até minimizado e deformado, eventos, acções, acontecimentos e até opiniões.
Toda a liberdade de escrever e dizer é respeitada, mas é respeitada até ao ponto que não ponham em causa, nem sequer o poder político, mas particularmente o poder económico.


Sempre que é posta em causa a opinião e as palavras dos chamados patrões da nossa economia.Sempre que são deixadas claras as suas estratégias e movimentações, para as quais é, diga-se de passagem, indiferente o partido do sistema que ocupe o poder. Normalmente essas opiniões e escritos jamais conhecem a luz do dia. Quando, por acaso, se dá o caso de virem a ser dados a estampa, tal acontece nas edições seguintes, em pequenas colunas desfasadas da matéria principal, e de tal forma amputadas que normalmente se tornam incompreensíveis para quem não conhece o assunto.
A nós, o povo, não é reconhecido nem respeitado o direito constitucional de sermos informados, porque aquilo que nos é dado a conhecer muito raramente, se é que alguma vez, têm ligação à realidade. É normalmente, e salvo raras e honrosas excepções, aquilo que interessa a quem possui, financia, ou publicita nos diferentes órgãos de comunicação.
A nossa imprensa não é livre. Os nossos meios de comunicação estão, de forma cada vez mais explicita, amarrados aos meios financeiros e ao capital até pela sua própria sobrevivência.
Com este panorama, em que nem sequer é necessária censura porquanto os próprios autores e quando não eles as suas chefias exercem autocensura, é óbvio que não possível esperar uma imprensa que funcione, de facto, como um quarto poder, mas somente um poder que expressa a voz dos seus patrões e cala tudo o resto.
Não podemos ficar calados. Todos nós que vemos ou sabemos ou opinamos sobre acções, eventos ou acontecimentos, temos o dever de falar sempre, temos o dever de chamar a atenção do nosso concidadão. Se nos impedirem nos jornais, nas rádios, nas televisões, colocá-lo-emos em sites, em blogs. Se nos fecharem os blogs e sites, escreveremos nas paredes e nos locais públicos. Se apagarem e arrancarem os nossos escritos e cartazes, di-lo-emos boca à boca, gritá-lo-emos se preciso for. Mas nunca nos calaremos!

terça-feira, 15 de junho de 2010

O “Dejá vu” arrepiante

Este artigo foi publicado no jornal " A Voz do Operário" enquanto editorial


Nos idos dos anos oitenta, perante uma crise de contornos similares aos actuais, mas com uma conjuntura apesar de tudo melhor do que a presente, pois não se havia procedido ainda à liquidação do aparelho produtivo nacional, Octávio Teixeira e Carlos Carvalhas, então deputados, chamaram a atenção do governo do bloco central para as consequências a médio e longo prazo das medidas então impostas, que procuravam resolver o problema financeiro sem resolver os problemas estruturais da economia portuguesa, fortalecendo-a e dotando-a de capacidade de enfrentar recessões internacionais.

Quem tiver pachorra para ler os periódicos da época sabe com certeza que o então Ministro da Economia Hernâni Lopes até lhes reconheceu razão, mas, pasme-se, dizia então o Ministro que primeiro se resolveria a questão financeira e que depois seriam iniciados programas que dariam resposta aos problemas estruturais da economia. E de facto assim foi. Passado menos de uma década os problemas estruturais desapareciam, uma vez que quando não há produção agrícola, das pescas e industrial seguramente não há mais problemas de como fortalecer as capacidades produtivas destes sectores.

Durante os eufóricos anos do Capitalismo popular “à la” Sr.ª Thatcher, as “ajudas” da Comunidade Europeia foram utilizadas pelos patrões em verdadeiras orgias de vaidades, e na realidade passado o vendaval da integração, com as imposições de abate de frotas, de fim das siderurgias e industrias químicas, ou o arranque da vinha e olival, nem mesmo aqueles sectores que se afirmava estarem a ser protegidos, como os têxteis ou o calçado, tiveram qualquer tipo de modernização de equipamentos e processos. Assim quando a abertura dos mercados os atingiu, por bem pequenos que os salários fossem, não poderiam fazer face à concorrência externa.

Restaram duas coisas, o Turismo, com os bem aventurados Sol e Mar a transformar todos os portugueses em barmans e camareiros, ou eventualmente até entregues a actividades menos dignificantes, e o Sector financeiro, de natureza parasitária, largamente beneficiário do empenhamento das famílias face à satisfação das suas necessidades. Primeiro endividaram-se pelas casas, depois pelo estudo dos filhos e finalmente, quando parecia que o futuro era a crédito, até para automóveis e férias.

Assim, quando estalou a crise financeira não havia um sector produtivo que protegesse o país. Sem ter, ou sem querer ter, mais por onde tirar dinheiro, lançou-se num frenesim sobre o cidadão condenando-o a menos salário com a imposição de um novo imposto de 1 e 1,5%. Complementando-o com o correspondente aumento de preços via aumento do IVA.

Estas condições duríssimas não resolvem no entanto a situação, porque no fim de contas não é possível resolver o problema de um país que vive a crédito sem medidas que estanquem essa necessidade. As dificuldades que os Bancos têm de arranjar crédito no exterior, e que os levam também a extorquir mais através da subida dos spreads, são apenas sinal que todos fantásticos lucros e offshores estão já empenhados eles próprios ao serviço da divida destes bancos ao exterior. E já não chegam. Inverter este processo, promover a produção e o mercado interno é a única via sólida para debelar uma crise que de outra forma terá um desenvolvimento cíclico em torno da expansão ou contracção das economias estrangeiras. Mas parece que nem todos vislumbram o quão arrepiante é este “dejá vu”.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Ética, empresas e pés dentro de água.

Este artigo foi escrito para o Registo, que não o publicou.... Porque seria???


Lendo um comentário de um jornal, no fim-de-semana transacto, encontrei uma informação assaz curiosa. Dava a boa nova o tal comentário que a Sonae vai submeter os seus gestores ao “juramento ético” da Young Leaders International.
Confesso que não conheço este juramento, mas confesso também que nem sequer tenho grande curiosidade em conhecê-lo. E não tenho grande interesse em conhecê-lo porque, conforme reza o Manifesto da Global Economic Ethic, que está na base deste juramento, a dignidade humana é o princípio ético base deste Manifesto, ora para se respeitar tal juramento é necessário que a dignidade humana seja respeitada.
O grande patrão da Sonae afirmou, no passado ano de 2009, que: "não há emprego para quem quer estar a passar os fins-de-semana com os pés na água". Ou seja quem se acha com direito a gozar um direito, pelo qual se lutou durante anos em todo Mundo, e que foi consagrado no longínquo ano de 1975: A semana-inglesa, não tem direito a emprego segundo a cartilha deste senhor.
Mais, achar que se deve acompanhar a sua família depois de uma semana de trabalho, seguir o crescimento dos seus filhos, cuidar da sua casa, ler, ouvir música, ir a um espectáculo, cinema, teatro ou museu, é para o dono da Sonae uma situação bizarra ao sábado "quando há tanta gente a querer qualquer emprego".
Donde se depreende que no seu entendimento o trabalho não é a forma com que o trabalhador ganha o suficiente para se manter a si e aos seus, para gozar o seu lazer, por outras palavras para viver com algum conforto e dignidade, mas sim uma actividade pelo qual deve ter as menores contrapartidas possíveis e que o forcem a aceitar qualquer condição, função ou horário, que lhe permita apenas sobreviver.
Estas palavras e ideias são absolutamente desumanas e contrárias aos princípios éticos que esta empresa se propõe a adoptar, daí é claro que não há qualquer seriedade nestas medidas, e que não são mais que uma nova tentativa de convencer que se está a fomentar a sujeição da economia às necessidades humanas.
A ética das empresas capitalistas é maximizar lucros, e não há Manifesto ou Juramento que altere isso, porque após as palavras existem os actos, e os actos vão sistematicamente no sentido da diminuição de direitos e regalias, a que os patrões chamam privilégios.
Não estou em crer no entanto que seja moda, ou que seja uma decisão tomada para “parecer bem”. Estou certo que, como rezava a crónica, se trata de um sinal aos seus colegas, um sinal que é necessário parecer que se muda para que se permaneça igual. Ou então no conceito de Humanidade destes senhores não cabem os Trabalhadores... Resta saber se por seu lado eles alguma vez couberam no conceito.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Os 300 mil

Este artigo foi publicado no semanário Registo



A Manifestação, levada a cabo pela CGTP-IN, reuniu cerca de 300 mil pessoas, entre sector público e privado, no protesto pelas medidas de austeridade que o Governo, em subserviência aos ditames da Comissão Europeia, como é aliás seu costume, intenta levar a cabo.
Nos jornais de domingo e blogs de segunda, data em que estas linhas são escritas, a tentativa de menorizar este número, recorrendo aos mais variados métodos, entre os quais o de observadores “independentes”, tem sido por demais óbvia. No entanto para quem esteve lá e viu, não restam muitas dúvidas sobre a dimensão desta demonstração. Especialmente para quem já esteve em outras manifestações que foram cotadas em 150 mil, 200 mil, 250 mil.
Por demais óbvia também, foi a tentativa de dizer que os números das manifestações convocadas pelos sindicatos se mantêm estáveis, motivo pelo qual estaria esgotada a capacidade de mobilização da Central Sindical e dos partidos de esquerda. Acontece é que sendo crescentes esses números, e admitindo como é plausível fazer que dos muitos manifestantes vários até votaram no partido do governo, ou mesmo que muitos mais ainda estão descontentes mas num grau que não os levou, ainda, a manifestar-se, bem pode o governo ir pondo as barbas de molho.
Aliás sentindo o lume a chegar a casa a Ministra do Trabalho veio a público no mesmo dia salientar a postura construtiva de outras estruturas “sindicais” que, como todos sabemos têm tido um historial muito infeliz no que concerne a defesa dos trabalhadores. Estas estruturas responsáveis têm aposto a sua assinatura em todos os acordos e pactos que têm condizido à perda de direitos laborais, têm dividido os esforços de luta e servido objectivamente de alavanca aos interesses do patronato. E por isso mesmo são apodadas de responsáveis por quem detém o poder e por quem detém o poder dos que detêm o poder.
Hoje, perante esta ofensiva cuja agressividade é das maiores jamais sofridas pelo mundo do trabalho, e não só aqui em Portugal, estes sindicatos da “área do poder” estão de tal maneira manietados pelos interesses que servem que são incapazes de esboçar uma outra qualquer reacção que não seja a habitual: “Vamos fazer concertação”. Só que há concertação há anos e tudo o que foi feito e concertado apenas nos conduziu ao ponto onde estamos hoje. O que vamos concertar amanhã? Se nos permitem a tanga para tapar as vergonhas? Ou se é mesmo tudo cru e ao natural?
Os mensageiros do costume, temendo, vêm já dizendo que uma Greve Geral sem eles não teria consequências, ou que seria prejudicial para os esforços do país, ou que seria um enorme fiasco, tendo em conta da consciência do povo português para os sacrifícios para o bem comum. Só que na cantiga dos sacrifícios não cabem o sector financeiro e os seus 5,5 Milhões de Euros de lucros diários.
Sim, foram 300 mil, talvez até mais. E trezentos mil são muitos em greve, se a houver, mesmo se nestes estiverem pensionistas, desempregados, precários. Sim, são trezentas mil vozes que a um sábado saíram de sua casa, abdicaram do seu descanso, e vieram para a rua gritar a sua indignação. Não finjam que não viram e ouviram, fazê-lo só serviria para lançar o lume ao óleo.