quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Solidário sim, caridoso nunca.


“Não são os teus bens que distribuis aos pobres, mas apenas lhes restituis o que lhes pertence. De facto, tu usurpas o que foi dado a todos para uso de todos. A Terra pertence a todos e não aos ricos. Contudo ela foi tomada por alguns em detrimento de todos os que a trabalham. Assim, estás a pagar uma dívida, o que é bem diferente de dar esmola de forma gratuita.”
S. Ambrósio de Milão (bispo e doutor da Igreja, séc. IV)




Com a quadra do Natal multiplicaram-se apelos à solidariedade das populações em relação em aqueles que, especialmente em época de crise, se encontram em pior situação, quer a nível económico, quer a nível social. A solidariedade, segundo o entendimento de quem faz estes apelos, é sinónimo de adquirir bens alimentares ou de higiene e entregá-los às entidades que os recolhem e depois os distribuem numa rede montada para o efeito.
Não vou contestar a boa vontade dos organizadores e dos milhares de voluntários que dão o seu trabalho em prol deste fim, nem vou contestar o espírito de partilha de quem compra e depois oferece os bens a estas organizações, mas contesto profundamente que se chame a isto solidariedade. Solidariedade é um acto da sociedade em redistribuir a riqueza gerada, de forma a que todos, mas todos, tenham acesso aos bens e cuidados elementares, garantindo a dignidade de todo o cidadão. Aquilo de que tratamos é caridade, e nem sequer uma que provenha dos mais ricos, porquanto estes são os donos das cadeias de supermercados, onde os outros compram, para depois dar, tirando assim dos seus magros salários ainda mais do que já contribuem com os impostos.
Não ficando por aqui, até aquilo que oferecemos, com arredondamentos e outras formas de dádiva, não contam como desconto no nosso IRS, mas como desconto nos impostos das grandes empresas que o apresentam como dádiva delas mesmas, fazendo ainda por cima caridade com o dinheiro dos outros.
A tentativa de confundir caridade e solidariedade deve-se à tentativa de fazer com que o comum do cidadão não se questione sobre qual o fim que levaram as suas contribuições para o Estado, e que deveriam garantir estes bens sociais aos mais necessitados. Na realidade as suas contribuições e impostos acabam por ir parar aos bolsos dos que mais têm, através dos subsídios e benefícios fiscais às grandes empresas, que assim nunca perdem, ganham aqui e ainda ganham o lucro do esforço dos cidadãos a ajudar os seus semelhantes.
Acontece que tampouco a pobreza é um fenómeno que apareça por magia, ou seja da escolha dos necessitados. A pobreza é fruto de políticas que persistentemente vão desviando a riqueza dos que trabalham para os chamados investidores, ou seja para o que já possuem capital. Estas políticas que em Portugal vêm sendo aplicadas desde 76 a esta parte, e que fizeram com que o nosso país paulatinamente se tenha tornado, juntamente com o Reino Unido, o mais desigual da União Europeia.
Em termos políticos, não podemos isentar da crise que vivemos o actual Presidente da República. Este enquanto Primeiro-ministro desde meados dos anos oitenta até meados de noventa, foi quem aprofundou e cimentou o modelo de desenvolvimento, privado e a desregular, cujos resultados temos hoje à vista. O modelo de desenvolvimento neoliberal, cujos ideólogos da Escola de Chicago, já haviam testado no Chile de Pinochet, antes mesmo de o terem aplicado sob a Sr.ª Thatcher ou Reagan, foi o mesmo aplicado por Cavaco Silva com a vantagem dos fundos europeus.
A ideia que este homem possa ser reeleito para a Presidência, para mais numa primeira volta, branqueando a sua responsabilidade na presente crise, apenas porque os seus resultados surgiram apenas quase uma década depois de ter saído do poder, é uma ideia sinistra a vários níveis, e que abre caminho a um governo que mais não fará do que aprofundar o desmantelamento da acção social do Estado e logo dos verdadeiros actos de equidade e solidariedade que se impõem para manter, e aumentar, a coesão social do país.
Várias das candidaturas que têm surgido, pese embora se apresentem como defensoras de uma alteração de políticas, na realidade têm ao longo de vários anos sido cúmplices ou coniventes com o receituário social e económico aplicado.
Isto não significa que o eleitorado que com elas se identifica não seja, na maioria das vezes, um eleitorado que se apercebe das injustiças sociais que foram sendo criadas e com as crescentes dificuldades para as classes que sobrevivem do rendimento do trabalho. Portanto e ainda que defenda a urgência de uma mudança de rumo para o país e uma dignificação do trabalho com uma mais justa redistribuição de riqueza, ainda assim defendo também que se impõe uma mobilização em torno destas eleições, empurrando para a segunda volta qualquer decisão que o povo português venha a tomar.
Os dias que temos pela frente são cruciais para a informação e reflexão, de forma a combater a manipulação de factos e memórias em relação aos candidatos no terreno. Só os actos de solidários podem mudar a sociedade, os caritativos apenas mascaram temporariamente a realidade.
Um bom ano de luta em 2011

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

As nossas mãos, as nossas vontades

fonte da foto: www.arquiteturaunimar.wordpress.com


Este texto foi redigido como Editorial para "A Voz do Operário"




Ainda Dezembro não havia começado e já há quem, antecipando o desespero dos portugueses após um de Janeiro, quando descobrirem que têm mais impostos e custo de vida mais alto, se proponha a vir hipoteticamente a governar com o FMI.
Além de ser um gesto próprio de quem tem uma visão insuflada do seu papel, esta atitude revela que a personagem se propõe já a ser o braço governativo de que por lei não tem direito e legitimidade de nenhuma espécie para governar.
FMI não é sigla de partido nacional e como instancia internacional não lhe compete impor qualquer política a seguir pelos estados, pese embora se tenha arrogado ao longo de anos o privilégio de submeter aos seus ditames e interesses e que esses interesses têm invariavelmente contribuído para o descalabro social nas nações que os têm aceite.
As políticas seguidas nestes já longos anos, vem sendo as receitas do FMI patrocinadas pela UE e que têm passado pelas perdas de direitos dos trabalhadores e pelo desmantelar paulatino dos alicerces sociais do Estado. As receitas desde que a crise se instalou apenas têm sido de intensificar essas mesmas politicas.
Os ditos mercados, que são apontados como culpados, como se não tivessem por trás gente com determinados interesses, não acalmaram e nem acalmam enquanto não obtiverem aquilo que tem no seu plano desde início, um novo código laboral que ultrapasse largamente as piores medidas do recentemente aprovado pelo Governo. Esta é a prédica do FMI e que o PSD se prontifica rapidamente a por em prática.
Não é segredo, que somos um dos países com maior precarização do trabalho onde, junto com o Reino Unido, existe maior desigualdade social. Mas isso não é, nem foi, motivo de preocupação do PSD, nem para o PS.
A Greve Geral foi uma enorme demonstração do descontentamento, mas não basta, é necessário concretizá-lo numa alteração da correlação de forças. As eleições presidenciais, porque nelas está também em jogo uma candidatura intimamente ligada a estas políticas, e porque nelas se envolve uma outra que propõe mudanças coerentes, são de uma enorme importância para redefinir as políticas a seguir e o redesenhar do futuro do país. Vai estar nas nossas mãos fazer destas eleições expressão das nossas vontades. Temos um mês para olhar à nossa volta, especialmente nesta quadra. Boas festas a todos.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

As linhas soltas do novelo.

fonte da foto:http://www.palavrarasurada.blogspot.com/



Os novelos são constituídos por uma linha que é, normalmente, uma trama de fios fortemente entrelaçados. Quando os fios se libertam desta trama o que acontece é enfraquecer a linha e deixar à vista a sua real natureza. O que é válido para o novelo é igualmente válido para as trapaças, donde os fios que agora transparecem de certas situações.
O primeiro novelo é a recente realização da melhoria de resultados dos estudantes, fruto das chamadas reformas do governo. É preciso notar, antes de mais, que os estudantes analisados não foram alunos que tenham sido integrantes dos novos modelos de ensino. Começa o novelo a desfiar, mas não fica por aqui. As condições de estudo que, com as obras realizadas nas escolas, deveriam melhorar, pioram. Pioram porque as obras não foram realizadas pelo Estado, não. As obras foram realizadas por uma empresa para a qual o Estado transferiu a propriedade das escolas e dos terrenos, com os dinheiros provenientes do Estado, via financiamentos do QREN. Acontece que no fim das obras as escolas não retornam ao Estado, ficam nas mãos desta empresa, que fica não só com o exclusivo da manutenção durante 10 anos, mas recebe além disso a renda pelo aluguer das mesmas…ao Estado, rendas que representam milhares de Euros por ano.
Isto representa o enriquecimento artificial de uma empresa, além dos seus administradores, às expensas do Estado. Empresa essa que mais tarde será uma apetecível presa a privatizar, deixando as Escolas portuguesas nas mãos dos privados. Desfiado o novelo na educação, vamos ao resto.
Outros dos fios à mostra são as leis do trabalho. Poucos meses depois do Primeiro-ministro e do Ministro do Trabalho terem garantido que “as reformas do código do trabalho eram suficientes” e que “não eram necessárias novas alterações”, mas mais que outros exigiram a facilitação de despedimentos e logo deixa de valer tudo o que foi dito avançando-se com novas propostas de facilitação dos mesmos e, com uma proposta muito curiosa, de fazer com que todos nós, através das contribuições das segurança social, paguemos as indemnizações que às empresas competia pagar. Ou seja onerar quem muitas vezes quem fica desempregado pela sua própria indemnização em detrimento dos seus patrões.
Mais um dos fios desta cada vez mais estreita linha, é a actuação do Governo português na sua relação com potências estrangeiras. Os telegramas que o Wikileaks revelou mostram de forma clara que o Governo português sabia e aceitou a utilização do espaço aéreo português e a base das Lages para voos da CIA relacionados com a transferência de prisioneiros de Guantanamo. Isto depois de ter jurado publicamente e no Parlamento, aos representantes do povo português, que nunca tais questões haviam sido sequer abordadas ou avançadas. Com isto a linha não deveria ter já força de coesão e deveria ter partido, e só por manifesta falta de força cívica tal não aconteceu.
Por mais estranho que pareça a mesma arte da mentira é praticada em outros locais, mas com ampla divulgação entre nós. Todos ouvimos a história da aplicação de excepção militar no que diz respeito aos controladores aéreos da AENA. Ouvimos, mas nunca nos deram a ouvir as razões destes trabalhadores. Estes trabalhadores foram sujeitos a um brutal aumento das horas de trabalho e uma redução de salário de 40%, não tem quem os substitua pois não houve formação de novos controladores nos últimos anos por determinação do governo do Estado Espanhol e especialmente é bom lembrar que estes trabalhadores não auferem de um único cêntimo do erário público porquanto são pagos elas taxas aeroportuárias. Se disseram basta, nas condições em que o fizeram, foi por estarem absolutamente fartos e por saberem que é melhor que o viajante tenha um prejuízo hoje para que não venha a ter um muitíssimo maior depois. Este é mais um fio que se solta e que a comunicação social, com a nossa no conjunto, se esforçou para esconder e para distorcer de forma a que ninguém se questionasse sobre os acontecimentos.
O novelo que foram enrolando, e a trama da linha que foram urdindo, estão cada vez com mais fios soltos. É necessário que cada vez mais gente se questione e os questione. É necessário que mais gente entenda que nem tudo (e cada vez menos) do que dizem e publicam nos meios de comunicação é verdade. É necessário que os comentadores e pensadores e opinadores de cátedra da nossa praça sejam expostos ao opróbrio público como serventuários que são de interesses que em nada se compaginam com os interesses da população. É necessário mudar. É urgente o tricô de Madame Defarge.

sábado, 4 de dezembro de 2010

A saúde privada priva-nos da Saúde, ou tenta…


O Health Cluster Portugal, entidade muito moderna, que até o nome já não é em português, e que agremia algumas entidades públicas e universidades com todo o alguém que é alguém nas entidades privadas da saúde, encomendou ao ISEG um Estudo cujas conclusões garantem que em 2020 não teremos Serviço Nacional de Saúde e que, portanto, é melhor entregarmo-nos desde já nas mãos dos privados.
Este projecto, que curiosamente tece loas a antigas fórmulas do século XIX, chamando-as de Estado providência, passa pelo fim da obrigatoriedade da permanência dos utentes no Serviço Público, a constituição de sistemas de descontos diferenciados, com acessos também diferenciados, cujo restante preço é ainda pago pelos clientes do sistema.
Não explica, porque não convém explicar, duas coisas: uma que se prende com os impostos, porque se não servem para fazer funcionar os serviços, servem para o quê? E outra que se prende com a criação de facto de sistemas de cuidados de primeira, para os que têm posses e um sistema de segunda, terceira, ou quarta, para quem não pode pagar.
Diz, comprazendo-se das suas palavras, o presidente desta entidade que não podemos ter qualidade em todo o lado, porém esquece que o encerramento de serviços não significou aumento da qualidade em lado nenhum e condenou muitos cidadãos à mais completa marginalização no que diz respeito aos cuidados de saúde, por não haver num raio de muitas dezenas de quilómetros qualquer unidade de saúde.
Em grande medida tudo se reduz à retirada do sistema de quem pode e a degradação para quem precisa, tudo sob a mentira de uma maior equidade e justiça. Não há, nem tem de haver melhoria de competitividade no sistema de saúde, pois os resultados deste sistema medem-se na melhoria da qualidade de vida e saúde dos cidadãos.
Dizer que é necessário reduzir, quem em número, quer em funções, um sistema de saúde que a OMS considerou o 12º melhor sistema de saúde a nível mundial, entre 193 analisados, é bem revelador que o SNS é um incómodo profundo para todos aqueles que querem tornar a saúde num negócio de vários milhões, mas que despreza os cidadãos que não têm posses, ou seja a vasta maioria.
É bom perceber que se hoje temos cuidados de saúde onde falta pessoal, onde se cometem erros, onde os tempos de espera são grandes, teríamos, se as “reformas” preconizadas por este grupo fosse adiante cuidados de saúde aonde nada faltaria em termos humanos e tecnológicos, mas somente para os que os pudessem pagar a peso de ouro e um sistema dito universal com carência dos mais elementares meios de diagnóstico e terapêutica.
A Constituição, a Carta Universal dos Direitos Humanos, as Metas da Saúde para Todos, garantem que a saúde é um direito de todo o homem e cidadão, mas para os que não vêem o mundo senão como uma imensa mercadoria, ela é apenas um bem comercial sujeito à compra e venda. Assim a sua privatização é a nossa privação.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O Rift entre direita e esquerda


foto fonte: mayhem-chaos.net



Após o desaparecimento da União Soviética e com ela de toda a experiência socialista em larga escala, os ideólogos do capital não perderam tempo em decretar o fim das divisões ideológicas entre direita e esquerda, dizendo muitos deles que esse tipo de divisão já não fazia sentido.


Os últimos vinte anos foram passados com os fazedores de opinião garantindo a pés juntos que a via por onde os Governos nos levavam era a única via possível a fim de dar resposta às necessidades humanas. Houve até quem tenha dito que o capitalismo era o único sistema capaz de satisfazer a humanidade.


Com isto assistimos à globalização das desigualdades, à exploração mais abjecta, à perda de direitos que levaram séculos de luta a conseguir, à sobrexploração dos recursos, à destruição de milhares de centros de cultura (tais como bibliotecas, museus, orquestras, companhias de teatro e bailado, etc.), ao encerramento de inúmeros centros de pesquisa científica, à diminuição dos níveis de cooperação com o terceiro mundo, e por fim à mercantilização de praticamente todos os recursos, inclusive os essenciais à vida humana como a água.


A crise, que hoje ocorre, nada tem de misterioso ou incompreensível, é a consequência natural de um processo que quanto mais riqueza acumulava numa camada, mais tinha necessidade de reaver as parcelas de riqueza que se lhe escapavam, procurando assegurar que todo o capital – primeiro o acumulado nas poupanças, depois o obtido directamente da remuneração laboral e por fim aquele que ainda não foi obtido, através do crédito sobre remunerações futuras – retornava ao ponto de partida. Isto, conjuntamente com as contenções salariais, provocou por um lado a permanente escassez de capital na circulação fiduciária, por outro o permanente défice dos Estados, com apropriações de impostos sempre insuficientes, dado que o sistema contributivo faz recair o grosso do esforço sobre as classes cujos rendimentos são preferencialmente provenientes do trabalho.


Neste sistema sempre cronicamente deficitário, e num país em que o financiamento é obtido junto da banca internacional sobre uma produção, cujo crescimento tem óbvios limites que não se prendem com a produtividade, mas com a incapacidade de aceder a matérias-primas e humanas a baixíssimo preço, a pressão para os cortes nos serviços do Estado são enormes, quer por parte da camada que vai acumulando internamente, quer do exterior. Numa situação em que o sistema bancário entrou em ruptura porque nos EUA a população deixou de poder pagar o encargo das dívidas (ou seja a amortização mais os juros exorbitantes), os fundos públicos canalizados para salvar o sistema bancário deixaram exaurido o Estado face às necessidades públicas. Daí que aumentou o recurso ao crédito que era obtido a taxas tanto mais insanas quanto maior era a necessidade. Que faz o Estado? Corta na satisfação das necessidades públicas, e aumenta a tributação sobre os mesmos que já sustentavam as necessidades. Não o faz sobre os que acumulam capital baseado num principio muito caro à direita que não se tributa os que geram negócios – Não estamos longe da política salazarista que desviava de quem consome, para quem investe – com a contradição insanável que sem circulação fiduciária não hà consumo interno.


A ideia que uma recuperação se faz somente com o aumento das exportações esbarra em duas barreiras intransponíveis, uma que um crescimento desse tipo além de expor o país às condições dos mercados internos de países estrangeiros, promove a emigração da população activa limitando as possibilidades do crescimento, isto sem falar no empobrecimento, envelhecimento e perda de competências e capacidades da população fruto da degradação da educação e assistência médica e medicamentosa; a segunda é que sendo as matérias-primas todas ou quase importadas e que a modernização do tecido produtivo é também grandemente dependente da importação de materiais e tecnologias, quaisquer exportações (a menos de que produtos de muito baixo valor acrescentado) estão presas ao aumento das importações e, portanto não contribuem para um equilíbrio ou superavide do comércio externo e consequentemente da riqueza do país.


O último Orçamento de Estado está recheado de medidas que preconizam estas soluções, promovendo um maior desequilíbrio da distribuição da riqueza interna (um desequilíbrio que não encontra precedentes nem nos últimos anos do regime fascista), e convém não esquecer que juntamente com o Reino Unido, Portugal é o país da UE em cuja distribuição de riqueza é mais desequilibrada.


É precisamente aqui que é traçada a fronteira entre ser de direita e ser de esquerda, é no combate às desigualdades e na promoção de sociedades em que as diferenças de rendimento se atenuam e se procura a realização da dignidade do indivíduo dentro da sociedade enquanto grupo coeso, se se define como de esquerda. Ou na concepção de uma sociedade em que o Estado é mínimo, só serve para defender os interesses dos grandes negócios, libertando-os das dificuldade legais e das tributações, para que cresçam livremente, criando no processo postos de trabalho, sem que se questionem que postos de trabalho ou quais as condições em que se exercem. Em suma é um Rift de natureza civilizacional que nenhum revés histórico poderá sanar.


A tributação das mais-valias mobiliárias realizadas por Sociedades Gestores de Participações Sociais (SGPS), Sociedades de Capital de Risco (SCR), Fundos de Investimento, Fundos de Capital de Risco, Fundos de Investimento Imobiliário em Recursos Florestais, Entidades não Residentes e Investidores de Capital de Risco (ICR) e a fixação em 21,5% da taxa aplicável a todas as mais-valias mobiliárias tributadas em sede de IRS e em sede de IRC, é no quadro de desregulamentação laboral, de cortes dos serviços públicos, do aumento de impostos directos e indirectos sobre a população, e principalmente num quadro traçado como terrível pelas forças do sistema – em que, segundo as mesmas todos têm de comparticipar no esforço – o traçar da linha por onde esse Rift passa. Quem a propõe, está a propor que a parte que acumula capital, seja impedida de retirar esse capital à massa tributável, propondo algo que é de uma clareza meridiana: Já que todos têm de contribuir, quem controla e participa nestas sociedades e fundos seja obrigado a contribuir para o Estado ajudando a financiar os bens sociais. Quem se lhe opõe, está afirmar que a acumulação de capital não deve ser perturbada e que não deve ser obrigada a contribuir socialmente, na convicção que esse capital deve ser investido para gerar novos lucros. Já vimos quem ficou de um lado e do outro do Rift.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Guerra ao Estado Social


Este post é escrito no dia em que a Greve Geral foi, para lá de tudo o que se possa dizer do lado do governo e patronato, um sucesso absoluto. Todos os correspondentes de meios de comunicação estrangeiros assim reconheceram, mostrando que hoje em dia é praticamente impossível, como foi noutros tempos, iludir a verdade.

Ouvi nas últimas horas, como já tinha ouvido antes, disparates vários, de pessoas que não tem qualquer tipo de consciência social e ainda não compreenderam que os benefícios sociais não são esmolas dadas por ninguém, mas descontos feitos pelos trabalhadores. Pessoas que dizem que a situação do país é difícil, mas ainda não compreenderam que as dificuldades foram geradas pela banca, que enguliu as contribuições dos cidadãos para o Estado, pois o Governo não se fez rogado em lhe entregar o dinheiro dos nossos impostos, pessoas que não compreeendem que a dívida de que hoje se fala não foi criada por nós, e portanto não é nossa, e não temos de aceitar qualquer sacrificio para a pagar. Quem a fez tem lucros de M€ 4,1 por dia, e qua alguns, maugrado a crise, triplicaram os seus lucros nos últimos tempos. Aparentemente certas pessoas não se questionam porque pagam estes impostos escandalosamente baixos.

A greve que teve lugar é um importante sinal para futuro e prova que apesar dos contratos a prazo, dos contratos temporários, dos recibos verdes, dos falsos estágios...apesar de todos estes contras que tentam enfraquecer a capacidade de mobilização e luta dos trabalhadores, estes estão determinados a não serem as vitimas de quem criou a crise, mas que a não quer pagar.

Antes do texto que escrevi para o Registo, e que não foi publicado, sem que qualquer justificativa me tivesse sido adiantada, deixo apenas um último pensamento. Foi-nos dito que a aprovação do orçamento de estado era fundamental para que os juros da dívida não chegassem aos sete por cento. Afinal com OE lá chegaram aos 7%. Depois foi-nos dito que com a aceitação pela Irlanda do plano de "ajuda" financeira da UE e do FMI, os mercados sossegariam e os juros da dívida não subiriam e, na verdade logo no dia seguinte se prova mais uma vez a mentira que por aí grassa. As tentativas vão no sentido de promover uma intervenção do FMI, para facilitar novas invectivas contra os direitos sociais e laborais do nosso povo, esta grave vai mostrar que não será com facilidade que submeterão o povo português.




Jurando fidelidade ao Estado Social o Governo Sócrates vai, com pretextos de diminuição dos gastos públicos, destruindo e degradando tudo o que é sistema de segurança social e serviços públicos. Não bastando as escolas, os hospitais ou os transportes, a última novidade é a destruição da ADSE, o sistema que garante protecção na doença aos funcionários públicos, esses mesmos que gozando já dos mais baixos regimes salariais viram ainda cortados os seus rendimentos em 5%.

Este sistema que foi criado, pasme-se, em 1963, garante que os funcionários públicos, mediante o desconto de salário obrigatório, possam recorrer a cuidados de prestação de saúde e a assistência medicamentosa a custos mais acessíveis. O facto de provir ainda do tempo do fascismo mostra apenas que até então se reconhecia que os funcionários públicos, por auferirem salários mais baixos em relação às competências, se encontravam entre os mais desprotegidos da sociedade.

Ao propor o fim da obrigatoriedade da ADSE, o que o Governo vai promover é que aqueles que mais ganham, e que podem recorrer a outros sistemas, se retirem e com eles as suas contribuições. Quem sobra? Sobram aqueles que menores contribuições fazem donde desequilibra-se financeiramente o sistema. Uma vez desequilibrado basta propor o seu fim para não aumentar os gastos e comprometer o défice. Brilhante não? Os ricos nada perdem e os pobres vêem-se cada vez mais sem qualquer protecção do Estado, esse Estado para o qual trabalham.

Mas só por alucinação colectiva se poderia rejeitar Sócrates e promover Passos Coelho. Se um jura defender o Estado Social e o destrói, o outro nem sequer faz segredo que a sua receita iria ainda mais além na velocidade da destruição dos benefícios sociais dos portugueses. Aliás isso ficou mais do evidente com o acordo do Orçamento de Estado, esse mesmo Orçamento que se não fosse aprovado iria colocar os juros da dívida nos píncaros e afinal mal que o foi, lá foram para os píncaros os juros da tal dívida, deixando à mostra a mistificação e a falácia que a bancarrota significava.

Como bem notaram alguns investigadores o Orçamento de Estado e as condicionantes a ele associados, de que a destruição da ADSE, a privatização do que resta dos transportes públicos, ou dos Correios, o encerramento de hospitais e sua venda ao imobiliário são apenas alguns exemplos, foi gizado e negociado por todo o tipo de interesses financeiro, nenhum dos quais mandatado eleitoralmente pela população, mostrando cabalmente o significado que democracia tem quer para PS quer para PSD. Só serve quando os serve.

Nunca em toda a história do Portugal democrático se viu semelhante ataque aos serviços sociais do Estado e, pese embora várias vezes se tenha tentado denegrir o Estado Social, destruir a sua capacidade de regular os processos económicos, de passar para mãos privadas os recursos e meios, se tenha degradado propositadamente o ensino, a prestação de cuidados de saúde ou o acesso aos bens culturais, jamais foi tão clara a convergência de Bloco central com vista a atingir estes objectivos.

Não basta ficar a falar, a lamentar e seguramente não se pode acatar pacatamente aquilo que nos querem vender como inevitável. A última inevitabilidade, que eram os juros da dívida, mostrou-se falsa na primeira curva do caminho e quem prometeu que não iria impor mais “sacrifícios” por impossíveis prepara-se já para que outros, como o FMI, os proponham por ele.

Chega de enganos e trapaças, merecemos como povo um rumo melhor e uma política diferente.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Repor a verdade!


A campanha de mentiras posta a circular, com interesse para os defensores da Aliança Militarista liderada pelos EUA, mas também para aqueles que ao não olharem a meios para atingir os seus fins acabam por justificar as medidas de reforço da repressão, tem como único objectivo minar a luta contra os objectivos de dominação dos territórios, dos seus recursos e dos povos e desmobilizar a campanha de luta pela libertação dos povos e, tal como dizia a canção, velha do tempo da Comuna, a independência do mundo.

Para desmascarar estas mentiras e reforçar os laços que nos unem por esse mundo fora, na procura de uma sociedade mais justa, fraterna e solidária, transcrevo na integra o comunicado do movimento "Paz sim, NATO não!", para que possa chegar a toods aqueles que a ele não tiveram acesso.






"Repor a verdade!
Comunicado da Campanha “Paz Sim NATO Não”


Face à notícia divulgada pela RTP sob o título «a ordem é de desobediência civil pacífica contra belicismo da NATO», assim como de outras notícias que têm vindo a público e que objectivamente distorcem a realidade quanto à real promotora e organizadora da Manifestação «Paz sim! NATO não!» que se realiza, dia 20 de Novembro, a Campanha «Paz Sim NATO Não»:

1 – Denuncia e rejeita qualquer ligação da Campanha «Paz sim! NATO não!» e da Manifestação que convocou, promove e organiza no próximo dia 20 de Novembro, às 15h00, do Marquês de Pombal à Praça dos Restauradores, em Lisboa às denominadas PAGAN, ICC, WRI ou outra qualquer entidade que não integre as organizações promotoras da Campanha «Paz sim! NATO não!»;

2 – Reitera que o ICC e o seu ramo em Portugal, a PAGAN, não fazem parte, nem têm qualquer tipo de ligação com a Campanha «Paz Sim! NATO Não!» e muito menos integram as organizações da Manifestação «Paz Sim! NATO Não!», de dia 20 de Novembro, em Lisboa;

3 – Repudia a atitude das denominadas PAGAN, do ICC e do WRI, que, numa vergonhosa e deliberada atitude de puro parasitismo político, procuram tentar associar de forma abusiva e inaceitável a Manifestação «Paz Sim NATO Não» às acções que entenderam vir realizar a Portugal, nomeadamente às chamadas «acções de desobediência civil»;

4 – Lamenta que órgãos de comunicação social continuem a dar cobertura a afirmações do ICC, do WRI e da PAGAN que para além de significarem uma deliberada provocação à Campanha «Paz Sim! NATO Não!» faltam comprovadamente à verdade, constituindo uma deliberada campanha de desinformação;

5 – Esclarece, uma vez mais, que discorda e se distancia das ditas «acções de desobediência civil» que mais não visam do que dar espaço mediático a iniciativas e sobretudo a organizações que, ou não têm qualquer implantação significativa na sociedade portuguesa, como é o caso da PAGAN, ou, como no caso do ICC, agem num claro desrespeito pelos movimentos da paz, sociais e populares em Portugal;

6 – Clarifica que a Manifestação «Paz sim! NATO não!» será expressão da longa história e tradição de luta dos movimentos da paz, sindical, social e político portugueses que a convocam, promovem e organizam, agindo em defesa da Constituição da República Portuguesa, que garante a todos os cidadãos o direito de manifestação, sendo neste quadro que realiza as suas acções e que exige e pratica esse direito;

7 – Esclarece, uma vez mais, que a Campanha “Paz Sim NATO Não” integra mais de 100 organizações portuguesas e que tem o apoio de mais de 30 organizações de vários países e do Conselho Mundial da Paz, que será expresso, amanhã, num Encontro Internacional a realizar em Almada, pelas 10h00 no Fórum Municipal Romeu Correia, assim como na participação organizada de dezenas de representantes internacionais na Manifestação «Paz Sim! NATO Não!»;

8 – Clarifica que os partidos políticos que integram as organizações promotoras da Manifestação «Paz sim! NATO não!» são o Partido Comunista Português, o Partido Ecologista «Os Verdes» e o Partido Humanista;

9 – Afirma que pelos dados que tem neste momento está em condições de informar a Comunicação Social que a Manifestação «Paz Sim! NATO Não!» do próximo Sábado será uma grande demonstração de força, combatividade, serenidade, alegria e de luta pela paz por parte do povo português.

18 de Novembro de 2010

A Comissão Coordenadora da Campanha «Paz sim! NATO Não!»

Organizações promotoras da Campanha “PAZ Sim! NATO Não!”:

A Voz do Operário / Arruaça – Associação Juvenil / Associação Água Pública/ Associação Cultural Recreativa / Vale de Estacas / Associação das Colectividades do Concelho de Lisboa / Associação das Colectividades do Concelho de Loures / Associação das Colectividades do Concelho do Seixal/ Associação de Agricultores do Distrito de Lisboa / Associação de Amizade Portugal-Cuba / Associação de Estudantes da Escola Secundária Dr. José Afonso – Seixal / Associação de Estudantes da Escola Secundária Emídio Navarro / Associação de Estudantes da Escola Secundária Gil Vicente / Associação de Estudantes da Escola Superior de Arte e Design – Caldas da Raínha / Associação de Intervenção Democrática / Associação de Reencontro dos Emigrantes / Associação de Solidariedade com o País Basco / Associação dos Inquilinos Lisbonenses / Associação Iniciativa Jovem / Associação Portuguesa de Amizade e Cooperação Iúri Gagárin / Associação Recreativa e Cultural de Músicos / Casa do Alentejo / Centro de Apoio a Idosos de Moreanes / Clube Desportivo “Os Águias” de Alpiarça / Clube Estefânia / Clube Recreativo União Raposense / Colectivo Mumia Abu-Jamal / Colectivo Socialismo Revolucionário / Comissão de Moradores do Alto Seixalinho / Comité Nacional Preparatório português do 17º Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes / Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional / Confederação Nacional da Agricultura / Confederação Nacional de Reformados Pensionistas e Idosos / Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto / Confederação Portuguesa de Quadros Técnicos e Científicos / Conselho Português para a Paz e Cooperação / Coordenadora das Comissões de Trabalhadores da Região de Lisboa / Direcção Regional de Setúbal do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local / Ecolojovem – Os Verdes / Escola de Mulheres – Oficina de Teatro / Escolas do Desportivo da Cova da Piedade / Escutismo Alternativo / Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal / Federação Intersindical das Indústrias Metalúrgica, Química, Farmacêutica, Eléctrica, Energia e Minas / Federação Nacional dos Professores / Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública / Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro / Frente Anti-Racista / Grupo Desportivo Recreativo das Figueiras / Grupo Recreativo Apelaçonense / Grupo Sportivo Adicense / Grupo União Lebrense / Inter-Reformados / Interjovem / Juventude Comunista Portuguesa / Liga dos Amigos da Mina de São Domingos / Movimento de Utentes dos Serviços Públicos / Movimento Democrático de Mulheres / Os Penicheiros / Os Pioneiros de Portugal / Partido Comunista Português / Partido Ecologista “Os Verdes” / Partido Humanista / Planeta Azul – Associação Ecológica Alternativa / Política Operária / Projecto Ruído – Associação Juvenil / Sindicato da Cerâmica do Sul / Sindicato das Indústrias Eléctricas do Sul / Sindicato dos Enfermeiros Portugueses Direcção Regional de Coimbra / Sindicato dos Metalúrgicos de Lisboa, Leiria, Santarém e Castelo Branco / Sindicato dos Professores da Região Centro / Sindicato dos Trabalhadores Civis das Forças Armadas, Estabelecimentos Fabris e Empresas de Defesa / Sindicato dos Trabalhadores da Aviação e Aeroportos / Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública do Sul e Açores / Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Norte / Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Vidreira / Sindicato dos Trabalhadores da Pesca do Sul / Sindicato dos Trabalhadores da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás do Centro, Sul e Ilhas / Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Celulose, Papel, Gráfica e Imprensa / Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos de Portugal / Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal / Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa / Sindicato dos Trabalhadores do Sector Têxtil da Beira Baixa / Sindicato dos Trabalhadores dos Têxteis, Lanifícios, Vestuário, Calçado e Cortumes do Sul / Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul / Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local / Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Agricultura e das Indústrias de Alimentação, Bebidas e Tabacos / Sindicato Nacional dos Trabalhadores do Sector Ferroviário / Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações / Sociedade Filarmónica União Piedense / Teatro Fórum de Moura / Trevim Cooperativa Editora e de promoção Cultural / Tribunal Iraque (Audiência Portuguesa do Tribunal Mundial sobre o Iraque) / União de Resistentes Antifascistas Portugueses / União dos Sindicatos de Aveiro / União dos Sindicatos de Braga / União dos Sindicatos de Castelo Branco / União dos Sindicatos de Lisboa / União dos Sindicatos de Santarém / União dos Sindicatos de Setúbal / União dos Sindicatos do Algarve / União dos Sindicatos do Distrito de Beja / União dos Sindicatos do Norte Alentejano / União dos Sindicatos do Porto / União Local de Sindicatos de Sines, Santiago do Cacém, Grândola e Alcácer do Sal / Universidade Popular do Porto."

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

As pernas curtas da mentira



"A embaixadora marroquina em Lisboa assegurou que a polícia procurava pessoas que perturbavam a ordem pública no Saara Ocidental e que não houve mortos do lado sarauí."

Com estas declarações o governo marroquino procurava escamotear as relidades e fazer crer que tudo o que faz é zelar pela ordem pública no Sahara ocidental. Bem pode declarar quando as realidades se impõem por si mesmas, tal como demonstram os filmes que aqui se reproduzem. Que vai a embaixada de marrocos dizer? que são encenações? montadas quem sabe pela Polisrio e pela Argélia? Parece-me que uma tal atitude passaria em muito o temerário chegando ao ponto da inconceiência, uma inconsciência que apenas a Indonésia de Suarto demonstrou nos últimos tempos.

É certo que Israel é useiro e vezeiro deste tipo de argumentos, mas Israel alicerça-se num messianismo louco que a população respalda e que seguramente o povo marroquino não tem.

Marrocos afirma que não houve mortos do lado saraui, mas quem são então ELGARHI NAYEM; BABI MAMUD GARGAR ou ALI SALEM LANZARI? As mentiras do reino de Marrocos não aguentam um escrutinio minimamente sério.

Mais tarde ou mais cedo, e aproximamo-nos desse momento a passos largos, Marrocos terá de retirar do Sahara. A única questão que se pode por neste momento é se essa retirada se vai fazer nos actuais moldes de governo do Marrocos ou arratará consigo o próprio regime.

Deixo a transcrição do comunicado do Ministério dos Territórios Ocupados da RASD:

"MAIS DE 4500 FERIDOS, MAIS DE 2000 DETIDOS, UM NÚMERO AINDA INCALCULÁVEL DE MORTOS
Quinta-feira, 11 de Novembro 2010

A cidade de El Aaiun durante os días após o desmantelamento criminal do acampamento de Gdeim Izik, mantém-se em estado de sitio. O exército, as forças armadas e a polícia, continuam a atacar as casas dos cidadãos saharauis, detendo todos que encontram, espancando famílias inteiras, sequestrando os jovens, sobretudo nos bairros de Skeikima, Bucraa y Mattalla, enquanto que nos bairros do leste da cidade, como Raha, Duerat e outros, até ontem de manhã se efectuavam rusgas continuas às casas pelos diversos corpos de repressão, obrigando os cidadãos a gritar "Viva o Rei", "Sahara Marroquino" e outras frases semelhantes. .

O exército roubou carros dos cidadãos saharauis para os queimar em plena rua, detendo os seus ocupantes e dezenas de jovens.

Estas detenções abusivas e indiscriminadas que são seguidas de torturas, são efectuadas pelo exercito e as forças auxiliares, enquanto a policia utiliza listagens de pessoas e casas, direccionando os seus ataques a jovens da Intifada e defensores saharauis dos direitos humanos.

Os detidos de que se tem conhecimento até agora, ultrapassam os dois mil (2000), ainda que alguns tenham sido libertados após terem sido brutalmente torturados e agora se encontrem em estado critico, refugiando-se em suas casas e outros lugares. Os centros de detenção localizam-se em:

Quartel da policia
Quartel das Forças Auxiliares
Prisão Negra de El Aaiun
3 quartéis do exercito
Escola secundaria Alal Ben Abdala
Dois espaços adaptados dentro do campo de futebol
Quartel da praia de El Aaiun

O número de feridos com ferimentos diversos, supera os quatro mil e quinhentos (4500). Devido ao estado de sitio e terror que se vive neste momento na cidade de El Aaiun, os feridos encontram-se escondidos nas suas casas sem se poder assim saber da verdadeira gravidade do seu estado de saúde.

A família do jovem Ali Salem Lanzari, que apresentava o pescoço fracturado, decidiu arriscar a viagem até Agadir por sua conta e às escondidas, para que o seu filho fosse atendido no hospital. O jovem faleceu à chegada.

Esta situação repete-se com muitos dos feridos mais graves que não podem receber cuidados médicos.

Testemunhas oculares contaram dezenas de mortos nos arredores do acampamento de Gdeim Izik e na parte leste da cidade de El Aaiun.

O número de desaparecidos é ainda indeterminado, contando-se já várias dezenas, não se sabendo se estão mortos, feridos ou detidos.

A dificuldade de efectuar uma contagem dos cidadãos saharauis é enorme, devido ao estado de insegurança.

Na cidade ocupada de Smara, realizaram-se ontem manifestações, de jovens estudantes do ensino secundário, em solidariedade com os cidadãos saharauis de El Aaiun. A policia dispersou os manifestantes com violência e para evitar uma revolta maior decretou o estado de sitio, suspendendo temporariamente as aulas até ao próximo día 19 de Novembro.

INFORMAÇÃO: MINISTÉRIO DOS TERRITÓRIOS OCUPADOS DA RASD"





terça-feira, 9 de novembro de 2010

Até à Liberdade é mais um passo.

O Reino do Marrocos mostrou, como se de mostrar precisa-se, que não está disposto a aplicar nenhum dos princípios de autodeterminação à dos povos da Carta das Nações Unidas, no que diz respeito ao Saara Ocidental.

Após ter hipocritamente assinado um acordo relativo a um processo de referendo, e digo hipocritamente porque o desenrolar do processo demonstrou que nunca fez tenção de cumprir, o Reino de Marrocos aproveitou a véspera do início de nova ronda negocial, a ter lugar em Nova Iorque, para invadir, e queimar o Campo de proptesto da Dignadade, raptando, prendendo e matando quem lá se encontrava, naquele que é já um dos mais graves processos repressivos contra a população saaraui de sempre.

Quem quer que conheça a actuação do Reino de Marrocos no Saaara desda marcha verde, ou mesmo a sua actuação dentro do próprio Marrocos em relação aos opositores ao regime, actuação terrorista que começou praticamente após a independência, com o assassinato do lider socialista Ben Barka, não estranha que mais uma vez direitos humanos nada significam para o Governo e o Rei marroquinos, e que para os seus aliados ocidentais a aplicação destes tem um significado maleável conforme as situações são ou não do seu agrado político.

Ninguém tem hoje dúvida que o "grande amor" de Marrrocos pelo Saaara Ocidental é um grande amor pelos fosfatos ou pelos bancos de pesca da costa saaraui,e que por aqui se fica pois em mais de trinta anos nem um só estabelecimento de ensino superior foi construído no território, nem as condições de vida da população local melhoraram e apenas vivem com relativo desafogo os colonos marroquinos que foram colocados no território, na tentativa de alterar demográfica e culturalmente a face do território, tornando os sarauis minoria na sua própria terra.

Históricamente conhecemos várias situações similares, como a Irlanda, a Africa do Sul, ou a Palestina, mas notamos que mais cedo ou mais tarde essas políticas estão destinadas ao fracasso, maugrado o tempo e o sofrimento que acarretam até serem derrotadas. Assim acontecerá também inevitavelmente com o Saara Ocidental.

As tentativas do Reino de Marrocos para levar os Saarauis a aceitar outra coisa que não a sua independência, por muito recurso aos meios violentos e por muitas tentativas de silenciar mediaticamente a questão, estão portando destinadas ao fracasso e nada mais claro do que o recente massacre para reconhecer isso. Seria mais produtivo que o Marrocos retirasse dese já, mantendo alguma face, do que ser forçado a fazê-lo perdendo a réstia de credibilidade que ainda têm.

domingo, 7 de novembro de 2010

Novembro intranquilo


Uma versão reduzida deste texto foi publicada na "Voz do Operário"

Este mês de Novembro de 2010 poderá ser muita coisa, mas aquilo que não será com certeza é um mês tranquilo, não por qualquer atributo próprio do mês, ainda que ao longo da história tenha sido rico em acontecimentos, mas porque é inevitável que perante flagrantes injustiças os povos reajam procurando zelar pelos seus direitos, especialmente em épocas em que estes direitos são calcados a pés.
A aprovação de um Orçamento de Estado, que além de esbulhar os funcionários públicos de uma parte importante do seu vencimento, castiga a restante população por via dos impostos de que o IVA, com o aumento para 23% de inúmeros produtos de primeira necessidade é um exemplo flagrante, foi apenas mais um gesto, por parte do Governo e do PSD, isto depois da passagem por vários Programas de Estabilidade e Convergência, que apenas são ou aspiram a ser Governo a fim de servir interesses que em nada se prendem com os do progresso do nosso país e povo.
Nada poderia ter maior clareza do que o anuncio da banca que, se for taxada nos seus lucros, fará recair sobre os consumidores essa mesma taxa. Ou seja mostrando claramente que não se faz rogada em absorver os fundos do Estado, quando está à beira do abismo, mas que não faz qualquer tenção de arcar com custos, por menores que eles sejam.
As grandes fortunas, os sinais exteriores de riqueza, a acumulação de várias pensões e funções milionárias, nenhumas foram alvo de qualquer controlo, restrição, corte ou taxação. Benefícios fiscais, as facilidades perante a segurança social a grandes transnacionais, tampouco sofreram alguma redução com o Orçamento de Estado proposto para 2011.
Alternativas como a proposta muito recentemente pela CGTP de reverter ao Estado os lucros das principais empresas durante seis meses, que não só aliviava os contribuintes como, ao mesmo tempo permitia a cobertura de 85% da dívida, merece da parte dos fazedores e defensores das políticas neoliberais, que estiveram na génese do desastre, a mais veemente condenação, porquanto põem em causa os ganhos dos mais ricos.
Ao mesmo tempo que a nível mundial estas políticas desastrosas são alvo de uma crescente condenação e acções de luta dos trabalhadores, as grandes potências, mundiais e regionais, procuram reforçar projectos de expansão da sua influência económica e apropriação de recursos, lançando mão dos aparelhos militares para garantir esse domínio, implementando em simultâneo políticas securitárias de reforço do aparelho repressivo, dentro e fora das suas fronteiras. O sinal está à vista com a Cimeira da Organização do Tratado do Atlântico Norte, a ter lugar em Lisboa nos próximos dias 19, 20 e 21, e todas as medidas de segurança que a envolvem a pretexto de impedir distúrbios e alteração da ordem pública.
A estes actos só acções muito determinadas podem mostrar que as populações não estão dispostas a pagar os custos de uma crise que não provocaram, com a qual nada ganharam e da qual vêm sendo as principais vitimas. As respostas necessárias não podem deixar de passar pela adesão maciça à Greve Geral do próximo dia 24 de Novembro e pela participação na Manifestação “Paz sim, Nato não!” que descerá a Av. da Liberdade, às 15.00 do próximo dia 20.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

À meia noite...caem as máscaras!


Este texto foi publicado originalmente no "Registo"

Até aos inícios do século XX, numa tradição que praticamente se perdeu, os bailes de máscaras terminavam com o desmascarar dos convivas quando chegava à meia-noite. Assim ao soar das doze badaladas todos deixavam cair as máscaras revelando quem na realidade eram sob a fantasia que haviam escolhido para impressionar os seus pares.
Hoje em dia o costume de realizar bailes de máscaras praticamente caiu em desuso, o que levaria a pensar que o costume de se disfarçar perante os olhos alheios teria também desaparecido, porém não tem sido o caso. As palavras, os actos e toda a mise-en-cene apresentada pelo maior partido da oposição deixam antever que após espernear, maldizer e vilipendiar o Governo e o seu Orçamento de Estado se preparam para permitir a sua aprovação, pelo menos pela sua abstenção porque o voto favorável se tornava indecoroso.
Fosse real a sua desaprovação, avançaria com outras medidas, e lembremo-nos que ainda muito recentemente o Coordenador da CGTP avançou com uma medida alternativa que não só aliviava os contribuintes como, ao mesmo tempo permitia a cobertura de 85% da dívida. Acontece que como esta medida compromete os lucros das principais empresas durante seis meses, a “oposição” à direita do Governo jamais a iria propor. Afinal não se põem em causa os ganhos daqueles cujos interesses defendemos, que são os mesmos que provocaram a dita crise e ainda aqueles que se sentam à mesa negocial para orientar e sancionar o Orçamento de Estado.
Curiosamente Orçamento que os deixa bem longe, se não completamente isentos, de qualquer esforço para reduzir o tal deficit que tão responsabilizado tem sido pela nossa desdita geral, mas que foi gerado pela intervenção do Estado para impedir os bancos privados de ir pelo cano abaixo. Ou seja ganharam com a intervenção do Estado; Não querem pagar; Propõem que paguemos por eles com os nossos impostos, salários, e benefícios sociais; e que faz o maior partido da oposição? Diz: Assim não pode ser, tem que cortar ainda mais benefícios sociais.
Assim, na hora da votação do Orçamento, após dialogarem uns com outros e com os banqueiros, qual meia-noite de baile de máscaras, vota-se e tudo fica aprovado. Terão risos, aplausos, declarações de alívio no país e no estrangeiro e no final, pagaremos nós a conta.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

E tu? Que fazes?




Texto publicado originalmente no "Registo"

Anos entram e anos saem e continuamos a deixar-nos enganar pelos que sãoescolhidos maioritariamente para decidir do nosso destino comum. Pagámos,continuamos a pagar e continuaremos a pagar enquanto não percebermos, enquantopovo, os engodos e enganos que nos atiram poderá nos levar a escolher aquelesque activamente trabalham em favor, não do nosso povo mas de uns quantos quevêem e continuam aumentando o seu pecúlio.
Se alguém duvidava, ou descria,das informações que vinham sendo dadas, apelidando-as de perigoso esquerdismo,sobre a diferença de tratamento dadas a uns e a outros aquando do esforço do reequilíbrio das contas do estado, mesmo que as responsabilidades destas não possam ser atribuído de igual modo a todos, não pode permanecer indiferente aquilo que vem expresso nas páginas do jornal Público.
O que este jornalfinalmente apresentou foi: As medidas de austeridade não afectam os mais ricos; As grandes fortunas continuam sem ser devidamente taxadas mesmo quando há sinais exteriores de riqueza, tais como barcos e aviões que não são controlados pelas finanças; O sigilo bancário, cujo levantamento é exigido para a continuação dos subsídios do Estado, não é levantado às grandes fortunas; O imposto sucessório, que tinha de ser pago aquando das heranças, por força dos partidos que têm formado os sucessivos governos, deixou de existir; A Banca praticamente não paga impostos e, se ameaçada afirma que os fará recair sobre o consumidor. Acrescentar mais algum comentário sobre estes factos é desnecessário pois eles falam por si.
Não falam porém de quem aprovou, promoveu ou promulgou estas leis, e muito menos ainda falam para onde foi o dinheiro dos contribuintes que serviram para salvar os bancos e seguradoras privadas da bancarrota. Ninguém diz, em lado nenhum, que as grandes empresas passaram anos a gozar de benefícios fiscais e quando estes acabaram se foram embora, nunca contribuindo para o crescimento efectivo da Economia do Estado. Ninguém diz que as políticas seguidas que fizeram recair sistematicamente sobre os trabalhadores os custos das sucessivas imposições estrangeiras, fosse FMI, fosse União Europeia, protegeram sempre os lucros, porque se disse e continua a dizer que são os capitalistas que promovem a geração de emprego, o que está mais do que demonstrado ser falso.
A verdade é que vamos pagar mais IVA, mais IRS, ter os medicamentos mais caros, pagar mais de transportes, deixar de receber abono de família e várias outras coisas que garantiam a uma população bastante pobre alguma fuga à miséria mais completa, mas quem sempre beneficiou com isso, nada vai sentir. Quanto aos funcionários públicos, promovidos a alvo a abater e apontados como malfeitores número um, vão perder de uma penada 5 a 10% do seu salário, quando durante anos os seus aumentos não ultrapassaram o 1,5%, e isto quando eram sequer aumentados. A inflação foi comendo os seus salários, mas nada disto levou as pessoas a perceber que os verdadeiros culpados estavam noutro lado e eram, normalmente os primeiros a acicatar as hostes contra os desgraçados, jogando com sentimentos de frustração da população dos quais a função pública nunca teve possibilidade de se defender.
Durante anos mentiu-se, manipulou-se, estimulou-se a inveja e o ressentimento, dividindo a população e garantindo assim as condições necessárias para levar a cabo uma politica de destruição dos sectores produtivos, dos serviços do Estado, da Educação, da Investigação Cientifica, e da Cultura e com isto de toda a economia nacional, para que algumas classes medrassem na oferta de tudo quanto ia desaparecendo quer pela importação, quer pela criação de iguais serviços no sistema privado acessível apenas a alguns, ou então suportado pelo mesmo Estado, que tinha deles abdicado, a peso de ouro.
Agora está à vista. Não é possível negar mais os resultados destas políticas, sobre as quais muitos teceram as maiores loas, mas que ameaçam lançar na miséria por muito tempo a nossa sociedade. Um pouco por todo o lado as lutas e as greves sucedem-se. E tu? Que vais fazer?

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Os Valores da República


Liberdade, Igualdade, Fraternidade; São, para quem não sabe ou finge não entender, os valores Republicanos por excelência. E quando se faz menção destes valores faz-se menção daqueles princípios que nos tornam um ser socialmente interventivo a qualquer nível da hierarquia do Estado mas também igual perante a Lei – Enfim o que equivale a dizer um Cidadão.


Nos últimos dias a Direita portuguesa, através de todos os meios disponíveis na comunicação social, deitou as unhinhas de fora e bolçou todo o rancor anti-republicano que a vem consumindo e lhe corrói a alma. O rancor que guarda em relação à República, advêm do facto desta ter sido uma alteração à ordem estabelecida e um corte com o passado, mostrando que as mudanças são possíveis e nascem na rua apoiadas pela população, mostrando mais ainda que só as que assim são feitas podem cortar com as estruturas sociais até aí estabelecidas e transformar a sociedade. Para a Direita é esse o crime da proclamação de 5 de Outubro – Ter sido uma Revolução.


Já os li escreverem que se era mais livre e democrático na Monarquia Constitucional, mas não os vi condenar a lei da rolha, o caciquismo, a existência de religião do Estado. Já li as suas investidas contra a Educação sob a República, afirmando que os índices de iliteracia desceram muito devagar, esquecendo que, fora uns quantos movimentos de iniciativa operária, a Escola católica era, durante a Monarquia a única acessível na maior parte do território, mas nada formativa e fora do alcance das classes menos abastadas. Já percorri os olhos pelo “machismo” republicano que apanhado de surpresa pelo voto de Carolina Beatriz Ângelo, retirou às mulheres o direito de voto, no entanto não o vi acompanhado pelo esclarecimento que durante o Reino dos Braganças mulher alguma teve tal direito, e que eram consideradas socialmente menores e praticamente propriedade dos maridos, sendo-lhes negado até o direito de por termo a casamentos que só se mantinham de nome. A Lei da Família, o direito ao Divórcio, acabando com a chaga social dos filhos ilegítimos, datam, convêm não esquecer, da Primeira República, e só o clerical Estado Novo fez reverter esses avanços e voltar às tristes condições de antanho.


Os ataques ao primeiro regime Republicano português, com todos os defeitos e tibiezas que teve, têm-se sucedido, mas houve quem por aí não se tivesse ficado e aproveitou para lançar ataques contra a forma Republicana de governo apresentando as Monarquias Britânica e Escandinavas como exemplos de maior republicanismo. Esta afronta é incomensurável. Um Estado onde uma Câmara constituída por gente não eleita, que ganhou direito de interferir nas decisões do Estado por direito de nascimento não é compaginável com os valores republicanos de Igualdade e Liberdade. Um Estado onde os Governantes e a sua família não podem ser acusados de corrupção, mesmo sendo clara a sua actuação, apenas porque nasceram governantes e tem portanto essa impunidade vitalícia face à Lei, donde uns são reis e outros súbditos, não pode jamais ser um estado em que todos os homens nasçam livres e iguais tal como exigem os Valores Republicanos, que alguns não conhecem.


A legalidade Republicana é, para esses senhores, algo intolerável porque torna os homens iguais. Para um destes cronistas a segunda República espanhola provocou o levantamento militar, a Guerra Civil e o franquismo, como se as eleições que levaram a direita a utilizar o exército para por fim aos avanços sociais que já estavam no terreno e que se adivinhavam já em marcha, não tivessem sido eleições livres e legais tais como as anteriores em que a direita havia tido maioria. Não, não foi a República e a sua existência que provocaram a Guerra Civil. O que provocou a Guerra Civil em Espanha foi o temor da direita em perder os seus privilégios, fossem de nascimento ou adquiridos, assim como foram vezes sem conta na história do último século. Utilizando este argumento o mesmo senhor poderia dizer que foi a monarquia que provocou o 5 de Outubro, e não o diz. Porque será?

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Viva a República!


Quando celebramos o centenário da proclamação do regime republicano em Portugal não podemos deixar de fazer uma breve reflexão do que o advento republicano trouxe aos trabalhadores e também das muitas esperanças de uma luta de décadas que acabaram por soçobrar pese embora a República se tivesse proclamado.
Não restam quaisquer dúvidas que o movimento operário foi, desde que começaram a surgir os primeiros movimentos anti-monárquicos, um dos principais esteios na luta e no processo que havia de culminar a 5 de Outubro. Num país rural, e grandemente analfabeto, o operariado urbano e as suas instituições, entre as quais se insere “A Voz do Operário”, permitiram o debate e a difusão dos ideais de igualdade, justiça e progresso, traços identitários dos ideais republicanos e sem os quais o socialismo seria impossível.
É certo que o projecto republicano, sendo um projecto progressista ao qual estavam associados a promoção das condições de vida e de trabalho, a valorização e reconhecimento dos direitos da mulher, a elevação da condição dos povos das colónias, era também um projecto da classe burguesa que procurava deste modo aceder a um grau de poder, até aí vedado por direito de nascimento, e para quem grande parte das aspirações dos operários, das mulheres ou dos autóctones das colónias eram não atendíveis.
A Republica de Outubro de 1910 nasce assim atravessada de enormes contradições que a conduzem em paralelo à lei do divórcio, à lei da greve, e à lei da promoção das colónias, mas também à recusa da igualdade da mulher, do voto universal e à admissão do lock-out, ou do flagelo dos contratados em África, situações essas que se irão manter e paulatinamente alienar os que mais entusiasticamente haviam para ela labutado, abrindo cominho para a sua destruição.De qualquer das formas coisas houve que nem os 48 anos de regime fascista puderam destruir, e lembremo-nos que a memória ou celebração da revolução republicana foram duramente cerceados durante esses anos, demonstrando que apesar de tudo ser republicano implicava directamente estar do lado do progresso social e da promoção das classes trabalhadoras. Por isso e apesar de todos os pesares continuamos, cem anos volvidos, a clamar: Viva a República!

sábado, 25 de setembro de 2010

A Cegueira mental


Há algumas semana atrás li uma coluna num jornal regional em que uma eleita do PSD na Assembleia Municipal de Montemor-o-Novo se mostrava espantada pelo presidente desta autarquia ter levantado a questão do ambiente, num dos seus discursos, apontando o dedo ao sistema capitalista. A eleita, ela própria amiga do ambiente, relembrava indignada as situações de atropelo ambiental que sucederam nos países socialistas, em particular da República Popular da China. Devo dizer que as razões desta eleita são reais e pertinentes, porém não fazem da sua preocupação Razão.
Li num jornal de ontem as seguintes palavras, de um ex-secretário da cultura: “Na verdade, se olharmos à nossa volta, para o mundo de 2010, para um modelo de desenvolvimento que está simplesmente a lançar no caos os ecossistemas e a provocar a morte, a fome, a doença, a deslocação forçada e a miséria de milhões de pessoas (…)”. Por aqui se vê que contrariamente ao que a aflita eleita opina a questão da apropriação dos recursos e da degradação ambiental está intimamente ligada ao modelo de desenvolvimento em que vivemos, ao qual podemos chamar muita coisa mas que no frigir dos ovos dá pelo nome de capitalismo.
Significa isso que muitos atentados ambientais não se tenham cometido sob o Socialismo? Decerto não. E é preciso que, ao criticarmos o sistema capitalista, tenhamos em conta esse passivo, mas é necessário também colocar em perspectiva os quadros em que se deram esses atentados. Na realidade todos se deram num quadro de competição aguda com o sistema capitalista, tanto os cometidos ao nível da produção, como os cometidos no tratamento dos resíduos, o que é bem diferente daqueles que se cometem procurando aumentar os ganhos dos detentores dos meios de produção. E, sendo que nenhuma das atitudes é desculpável, os pressupostos da segunda são particularmente criminosos, porque indiciam o conhecimento exacto das consequências e o descaso em que ficam as populações sujeitas às mesmas.
Se no sistema Socialista quando se visava aumentar as produções para que as populações auferissem de uma maior quantidade e variedade de produtos, quando se descuraram os sistemas de tratamento face a situações económicas complicadas, por não se querer fazer recair esses custos sobre a população, isso revela algum descuido em relação ao meio e mesmo alguma sobranceria perante consequências que, diga-se de passagem, à altura eram em muitos casos não completamente conhecidas. No sistema capitalista por seu torno, na maior parte dos casos, as consequências sobre o planeta não só eram conhecidas, como as grandes empresas pressionavam economicamente para que não fossem divulgados, prosseguindo, depois de conhecidas, com tentativas de as desacreditar.
Com efeito, e apesar de existirem danos relevantes, não existe nem equivalência nem paralelo entre a destruição ambiental e apropriação de recursos entre os dois sistemas. Politicas que não respondem às necessidades humanas, desinvestindo da cultura, da educação e dos cuidados de saúde, não servem as gerações futuras, assim como não servem as presentes, o desemprego, a exploração salarial e o decréscimo da protecção social. Se a estas condições adicionarmos a destruição dos sistemas naturais de suporte, a poluição, o caos urbanístico e a sobre-exploração dos recursos temos o quadro da economia globalizada que vem sendo o modelo de desenvolvimento vigente.
Afirmar, tal como fez a referida eleita que os comunistas só tarde acordaram para a questão, é desconhecer que a primeira análise feita sobre as sociedades, adoptando os contributos de Humboldt (o pai da ecologia), foi precisamente a Dialéctica de Natureza de Frederich Engels, donde não só conhecem estas questões como foram os primeiros a debruçar-se sobre o assunto.
A Cegueira mental é a pior delas todas.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Season talvez, Silly nunca!


Há um costume de chamar ao pino do Verão, Silly Season, que de uma forma geral se poderia traduzir por Estação palerma, isto porque durante anos a segunda metade do mês de Julho e o mês de Agosto, foram épocas em que quase todos os serviços permaneciam fechados e que ninguém ou quase ninguém assumia decisões de importância relevante. Contudo, de há alguns anos a esta parte estes meses vão sendo ricos em alterações e decisões que nos tocam directa, ou de perto, a todos, e que, na maior parte das vezes vão passando por entre as salinas águas e o extenso areal.

A decisão de encerramento de mais de 700 escolas foi tomado, pelo ministério da educação, durante o mês de Agosto, deixando quase até ao começo do ano lectivo a vida de inumeros professores e pais de alunos em suspense. Não foi por acaso que esta decisão é assumida em Agosto, ela é assumida neste ápoca porque é a altura em que a mobilização e contestação é mais difícil.

Não foi por acaso também que é nesta altura também que são anunciadas as suspensões dos apoios às escolas de curricula artistico integrado, que permitiam às crianças desenvolver os seus dons sem perderem o acesso adequado aos planos curiculares em vigor. Também esta decisão se tenta fazer passar sem, ou com a mínima, polémica e, apesar da cultura não ser exactamente o forte do nosso povo, também aí não se poderia correr o risco de ver desmascaradas as acções do governo.

Na mesma linha se barra, com o fim da escola móvel, o acesso à escola de centenas de crianças filhas de artistas circenses ou de feirantes itinerantes. Estes por norma são pouco reivindicativos, até pelas suas próprias condicionantes de vida, mas não fosse o diabo tecê-las, deixaram para o mês de Agosto o anuncio do encerramento da única possibilidade destas crianças acompanharem os planos curriculares.

Mas não se pense que é só na educação que estas situações acontecem, é costumeiro ver os anuncios de consultas públicas que se desenrolam durante esta estação. Para que não fiquem dúvidas durante este Agosto do ano de 2010 é nada menos do que a Avaliação de Impacte Ambiental do Novo Aeroporto de Lisboa que estará disponível para que os cidadãos se pronunciem. Um questão de "tão pouca" importância a nível nacional pode ser questionada popularmente na "Silly Season" sem consequência de maior.

E se o Estado faz, muitos Municipios não fazem pior, basta ver em Lisboa o período de decorrência do Projecto para a Baixa, que se desenrola até 15 de Setembro. É mais do que evidênte a participação que se pretende para ostes projectos.

É assim a estação Palerma não o é de facto. Serve é para tentar fazer de nós palermas.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Colecção de Patranhas

Este texto foi publicado originalmente na "Voz do Operário"

Não sendo um grande coleccionador, nunca além de selos, postais, bilhetes de transportes, pacotes de açúcar, achei-me neste início de Verão com uma colecção que de todo procurei, uma colecção de patranhas. Os partidos que têm dominado o poder nos últimos anos, os determinantes da Europa, e até outros que teriam por dever agregar-se na luta contra a falsidade, foram com a crise, nas suas múltiplas formas, pródigos na oferta de patranhas com que se vai torpedeando a capacidade crítica, baralhando o pensamento e assim intrujando os portugueses sobre a realidade e a posição a assumir sobre as questões nas quais as patranhas incidem.

Uma das primeiras peças da colecção é a própria necessidade de sacrifícios para “vencer” a crise. Um Governo que entrou com milhares de milhões de Euros para salvar a Banca, que permite que passem em brancas nuvens os lucros de M€ 5,5 da mesma, cobrando em seu lugar ao cidadão impostos que recaem inclusive sobre os géneros mais necessários à sobrevivência; Um Governo que permite a continuação de off-shores livres de qualquer regulação imposto, autorizando a subtracção de centenas de milhares de Euros ao erário público e ao mesmo tempo exclui das prestações sociais os elementos dos agregados que pouparam, por vezes com grande sacrifício, algum dinheiro e que sobre o mesmo pagaram os devidos impostos; Não pode afirmar que estes sacrifícios são imprescindíveis para salvar o País e contudo vende esta patranha.

A segunda peça de patranha vem de uma certa oposição que afirma, quanto mais precários houver, mais emprego existirá. Ora uma tal medida não e em favor das necessidades da população. Como é possível que se mantenha gente anos a fio, sem saber o dia de amanhã? Sem poder planear a sua vida, sempre com medo de adoecer, de engravidar, de ser despedido. Tais medidas só permitem a que aqueles, a quem a “crise” não afecta, embolsem mais uns tostões, baixando salários e baixando direitos, expondo os trabalhadores a toda a espécie de arbítrio e opróbrio. Dizer que tais medidas promovem o emprego e são necessárias para a saída da crise e de uma absoluta falsidade e contudo vende-se esta patranha.

Mais uma obra-prima de patranha é aquela que afirma que devem ser negados os benefícios do rendimento de inserção social a cidadãos com cadastro. Esta patranha é particularmente insidiosa porque muita gente rapidamente adere a ela, sem mesmo notar que está a condenar um cidadão pela segunda vez, desta feita condenando-o a não ter qualquer saída reabilitante para a sua vida, empurrando-o impiedosamente ao recomeço do crime. É uma patranha com dois fins, um granjear apoio fácil entre as mentes mais mesquinhas, a segunda garantir que o crime se mantenha em valores altos, permitindo e autorizando medidas securitárias tão caras aos vendilhões da patranha.

Não acabarei a apresentação desta colecção sem falar dessa preciosidade da patranha que é considerar que a austeridade que nos impõem é criminosa, mas…ao mesmo tempo, entender que é aplicável aos gregos. Esta patranha foi desenvolvida com o apoio à participação de Portugal ao empréstimo da UE à Grécia, empréstimo esse que
trazia agregadas as condições de austeridade que foram de facto impostas, disfarçando esta atitude de ajuda desinteressada. O empréstimo em causa não servia, nem jamais pretendeu servir, os trabalhadores gregos, mas sim ajudar a banca grega a salvar dividendos através da criação de condições para aumentar impostos, privatizar e reduzir benefícios sociais. Coisa que aqui os fabricadores da patranha já entendem inaceitáveis.

Pois é, As patranhas são assim, vendem-se por necessárias e boas medidas, mas na realidade têm a equivalência do conto do vigário. Resta saber quem as compra.

E fez-se luz!

Este artigo foi publicado no Registo originalmente.



Desde o dia das eleições até hoje vivíamos com a estranha sensação de ter um governo que, sendo minoritário, agia como uma maioria na certeza de que havia alguém que lhe respaldava os movimentos, mais coisa, menos coisa.


Os partidos da suposta oposição à direita faziam, de quando em vez, um barulhito, levantavam umas questões, propunham coisas ainda mais monstruosas para os portugueses, mas que acabavam em coisa nenhuma e…no essencial, aprovavam candidamente todo o pacote de medidas de austeridade com o governo entendeu brindar os cidadãos, para satisfação dos bancos e financeiros, nacionais e estrangeiros.

Tudo isto foi sendo feito, mas nunca foi claramente assumido. Se o governo propunha algo, logo de seguida vinham propor o algo e mais qualquer coisa, que retirasse ainda mais direitos sociais, coisa que aliás tratam de chamar de privilégio, como se não tivessem sido pagos em impostos e em taxas, por vezes até a valores superiores ao dos custos.


De repente alguém falou e fez-se luz. Cansados de estarem com um pé dentro e outro fora da governação, alguns propuseram abertamente uma coligação tripartida, para melhor pôr em prática as políticas, que qualquer deles sufragam, mas que não têm coragem de aplicar a solo e ficar com o odioso da questão.

Necessitando desesperadamente de mostrar que é diferente, o principal partido da oposição faz uma fuga para a frente, em face da nudez da situação, e apresenta propostas para uma revisão da Constituição que, não só colocam em risco todos os princípios fundamentais do nosso Estado de direito, como abrem caminho às situações mais abjectas como o fim dos cuidados de saúde tendencialmente gratuitos ou da necessidade de justa causa para os despedimentos, colocando desta forma no foro de favor e caridade o que jamais poderia sair do âmbito da justiça e da equidade.

Mostram-se assim numa posição de vilão, que apenas ajuda o mau porque este lhe abre caminho a fazer pior, e deixa o governo com um aura de direitismo com sensibilidade social em comparação com a sua completa falta dela. Donde se poderia concluir erradamente que desejam coisa parecidas no geral mas diferentes na essência.


Se fosse de imaginar complots diria que esta atitude serve apenas para garantir que, por muito mau que este governo seja ainda existiria pior. Daí a população aterrorizada escolheria, ainda assim, entre um diabo que conhece e outro que nem deseja conhecer nos seus piores pesadelos.

Isto leva-me a pensar que, para os donos do poder este poder serve, e outro só serviria se pudesse ser a três e assim chegar mais longe. Mas seguramente o que não lhes interessa é um governo que com o seu aventureirismo maximalista ponha em causa os avanços que tem almejado na imposição das suas políticas e interesses.

Com efeito, com a proposta da coligação tripartida e com a Constituição laranja, esta semana foi daquelas em que sobre mais assuntos se fez luz.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Arreda!!!


Este texto foi publicado originalmente no Registo:


Nos estertores da monarquia ficou conhecido o infante D. Afonso, irmão do rei, pela alcunha do arreda. Isto porque na falta de buzina o ínclito cavalheiro bradava fortemente “Arreda” a todo o ser vivente que se encontrasse na rota do seu automóvel, coisa que frequentemente acontecia em virtude da raridade dos ditos e da velocidade atingida, pouco vista também ao tempo.

Parece que cem anos volvidos corremos o risco de ter um novo, ou no caso uma nova, arreda. No caso não podemos dizer que se trate de um excesso de velocidade que leva a nossa Arreda a apressar-se a congratular-se com o afastamento de um membro do pessoal da orgânica do seu serviço, poder-se-ia dizer que é indubitavelmente a falta de velocidade que levou a isso, ou mais venenosamente a necessidade de encobrir essa falta de velocidade.

O arredado, por sua vez parece que já se teria tentado arredar em meados de Fevereiro, e por essa altura tal movimento não foi aceite, o que diga-se de passagem constitui um novo paradigma, escolhe-se quem levar as culpas, espera-se até às situações atingirem os foros de insustentabilidade, e depois arredam-se os indivíduos espalhando-se alto e bom som que são eles os culpados de todas as malfeitorias.

Uma ministra vinda do meio cultural deveria ter por certo que a arte raramente é lucrativa, e que quando isso acontece normalmente deixou de ser arte e passou à condição de mercadoria. Acontece que os artistas não são merceeiros e nem podem ser tratados como tal. Parece que o arredado viu isso, mas a nossa Ministra Arreda não.

Durante muitos e muito anos, a arte foi fomentada pelos reis ou ricos homens que queriam ver a sua importância e pujança económica reconhecida pelos demais. Aliás num tempo em que o Estado era ele, o rei utilizava a arte para promover não só o seu poder mas a munificência do reino. Donde pertencia ao Estado a parte de leão no financiamento do processo artístico. Camões ele mesmo não poderia sequer ter sobrevivido sem a tença real, por parca que fosse.

Tal como em outros temas, o nosso actual governo, como aliás os seus antecessores, entendem que aquilo que não dá lucro não serve para nada, donde o processo artístico tem de se sustentar a ele mesmo e, espante-se, afirmam pretender acabar com o parasitismo e a subsídio-dependência. Ora estas palavras e ideias só podem vir
de quem desconhece completamente o mundo da cultura. Os ganhos que se obtêm para o nosso povo, e que advêm deste sector, não são mensuráveis em Euros. Nem se
pode esperar que um criador ou objecto (salvo quando o tempo os torna em valores de comércio e posse apetecíveis) possa gerar meios de subsistência. Se assim fosse quantos famosos artistas e reconhecidas obras de arte, jamais se formariam ou conheceriam a luz do dia.

O princípio de que todo o produto do génio e trabalho humano são objectos de troca e bens comerciáveis, é então não só contrário à própria criação artística como, pela estreiteza dos seus limites, absolutamente incompatível com o processo de criação artística. A desvalorização dos ganhos civilizacionais provenientes da cultura é, na visão dos nossos governantes, idêntico à desvalorização do processo educativo e do acesso à saúde. No entendimento dos nossos governantes estes são luxos e privilégios e não direitos inalienáveis do nosso povo. Daí que não admire as variadíssimas tentativas de por em causa estes direitos no texto constitucional.

Todos sabemos que, com a Revolução de 5 de Outubro, o destino do nosso Arreda foi, uma vez arredado ele da esfera do poder, partir para o exílio onde, suspeito deve ter passado os seus dias arredando outros em qualquer outra língua. Veremos se com o centenário da proclamação da República, também o destino desta e de outros arredas seja o envio para um exílio de poder de onde será desejável que não voltem.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Silence like a cancer grows


Pedi emprestada esta frase à canção de Simon & Garfunkel porque sempre achei que definia bem certo tipo de silêncio. Em vez de reparador o silêncio a que me refiro é aquele que não dá réplica e que podendo não ser consentimento não é de ouro certamente.

As opiniões são fruto da nossa condição social de produção e formação teórico-ideológica (sempre achei esta formulação genial e pese embora não seja também ela original, devo o seu conhecimento a uma Professora de Geografia, entendo que é perfeita para a caracterização do individuo enquanto ser social), donde cada opinião terá por maioria de razão de ser diferente de pessoa para pessoa, embora possa ter pontos de contacto entre os vários indivíduos conforme a sua proximidade vivencial ou de processo de criação teórico.

A ausência de postura, discordante ou não, em face de uma opinião expressa, é normalmente ditada pela incapacidade crítica em relação à ideia veiculada pelo emissor, seja este um contraponente directo ou meramente uma opinião veiculada em outro momento e registada para análise posterior.

Para um autor que funciona como contraponente indirecto, a crítica à sua análise não só é extremamente importante, como é ela que estabelece um processo dialéctico, entre tese e antítese, que conduz ao questionamento permanente das teorias aceitas e ao seu abandono ou aperfeiçoamento. A hipótese só pode ser superada ou confirmada pela observação da realidade ou da manifestação dessa realidade - o que aliás é o cerne do procedimento cientifico.

Na ausência da critica estabelece-se o silêncio, um silêncio que não só não é produtivo, como leva qualquer autor a considerar que os seus escritos são desinteressantes ou mesmo irrelevantes para o conjunto de pessoas que poderiam ser os potenciais alvos, no sentido de potenciais interessados, das opiniões expressas.

Neste sentido o cancro do silêncio foi tomando conta deste blog, deixando o seu autor na dúvida de não estar a conduzir na maior parte das vezes um solilóquio, apenas superado de tempos a tempos por algum amigo ou mais raramente ainda por algum "navegante solitário" que aporta a este porto.

Assim, e embora não se ponha em causa a continuação do blog, instava-se, provocava-se, desafiava-se os eventuais leitores a não deixarem o silêncio tomar conta de tudo.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Não somos tontos.

O Presente artigo foi publicado no Registo - infelizmente então por uma distração ficou com um parágrafo quase ininteligível.

Num dos números deste jornal um comentador, explicava de forma muito pedagógica, às crianças e aqueles que teimosamente não querem compreender, que os sacrifícios exigidos aos portugueses são necessários porque um Estado não pode gastar mais do que produz, o que seria o caso do estado português, excepto em situações de especial necessidade de investimento, que o levaria a endividar-se.

Nada a opor á explicação assim dada…excepto que não corresponde de todo à realidade. Os dados que vão sendo tornados públicos, quer pelo Eurostat, quer pelo INE, são de uma clareza meridiana em relação à desigualdade da distribuição da riqueza produzida, variando entre 59% para os salários em 1975 (é bom de ver que mesmo no fim do regime fascista, 1973, a parte do rendimento nacional que os trabalhadores portugueses recebiam correspondia a cerca de 47,4%, de acordo com o Banco de Portugal), perdendo desde então até hoje face aos lucros, com a inversão que se veio consubstanciando, sendo em 1995 de apenas 35% e em 2002, menos de 37%.

Em contrapartida o valor destinado aos lucros subiu vertiginosamente, de 24,3%, para 40% do PIB, entre 1975 e 1995.

Assim temos hoje os 20% da população mais pobre a receber 5,0% do Rendimento líquido nacional e os 20% da população mais rica recebendo 44,9% do mesmo rendimento, ou seja 7,6 vezes mais.

A própria União Europeia, em relatório de 2008, apontava Portugal como o país mais desigual da União, sendo que as despesas com a protecção social representavam 24,9% do PIB do país, valor abaixo da média europeia, que ficou em 27,3%.

Mas tudo isto poderia até entender-se se a riqueza produzida fosse de facto tão baixa que a sua redistribuição fosse difícil. Acontece que segundo Luís Bento, professor na Universidade Autónoma de Lisboa, Portugal tem uma riqueza muito perto da gerada na Finlândia, donde é por demais óbvio que o problema mais do que na geração de riqueza, está na deficiente redistribuição da mesma.

Como é feita a redistribuição de riqueza? Muito simples, são precisamente os investimentos em bens sociais, como a escolarização, a saúde, o direito ao lazer, que permitem aos trabalhadores usufruir da riqueza gerada pelo país e ao mesmo tempo ser a força motriz do mercado interno.

Afirmar-se, como é afirmado, por vários comentadores que os direitos sociais não são eternos, ou que temos de prescindir deles para permitir um equilíbrio nas contas do país, é à luz destas informações uma enorme mistificação de forma a permitir que aqueles 20% que já se apropriam de uma vasta parte da riqueza nacional, possam ver aumentada mais ainda essa parcela.

As injustiças, que foram geradas ao longo destes anos, têm assim todas as condições para se agravar, condenando de forma muito objectiva, cada vez mais cidadãos às condições de pobreza, ou de limiar de pobreza. Por isso fazer frente às medidas propostas pelo PEC e por várias coisas que lhe estão apensas, não é defender teimosamente o Estado, é defender as condições de vida e trabalho justas para o nosso país e o nosso povo. É que ao contrário do que julgam não somos nem crianças, nem tontos, e já agora, não insultem a nossa inteligência.