sábado, 16 de junho de 2012

Lavem daí as mãos



Não sei se me dá náuseas, se me enraivece, se voto ao desprezo os autores de tais dislates, o certo é que a minha paciência é pouca para tantas palavras hipócritas.
As Parcerias Publico Privadas, lançadas pelo Governo PS eram os esquemas perfeitos para ir exaurindo paulatinamente o Estado em favor de grupos privados, em que todos os riscos eram suportados por todos nós – o Estado – e todos os ganhos amealhados por estas empresas. Algo como se de cucos alimentando-se da progenitura alheia se tratassem.
É claro que o actual Governo do PSD/CDS-PP tem muito pouco para falar, uma vez que foram os seus predecessores da mesma maioria que alicerçaram os modelos destas parcerias e, portanto abriram cominho para depois o PS prosseguir na mesma senda.
Até aqui, todos de acordo e conversados!
O eu não é admissível é que a população comentadora em blogs e redes sociais venha dizer que “os políticos” são culpados, que o Presidente deveria vir da sociedade civil e não dos partidos, ou que toda a gente deveria votar em branco e outras tolices quejanda.
Pergunta-se: Em quem votaram sucessivamente os qua assim falam? Sem muitas dúvidas de que votaram nos mentores destes esquemas. Desconhecem por ventura que não temos nenhum dirigente da sociedade castrense, a única que existe para além da civil? Que impolutas criaturas são estas que primeiro apoiam quem traça as políticas, renegam e insultam quem os alerta e depois se atiram como cães raivosos indiscriminadamente procurando lavar a sua má consciência? Quem querem elas convencer? Iludir-se a si mesmas? Não querem estes políticos, mas dão-lhes muito jeito estes mesmos para justificar a sua inércia a sua falta de participação, a sua ignorância e pesporrência.
Calculo que a consciência de Pilatos não deve ter sido limpa de maneira muito diferente, lavando as mãos de responsabilidades que lhe cabiam se não por inteiro em grande medida, e fingindo que nada daquilo era com ele.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Austeridade au Sauce Hollandaise!


O Presidente da República Portuguesa teve uma súbita tirada esta semana, das raríssimas vezes que conseguiu articular duas frases com sentido, em que se regozijava com o facto de medidas de crescimento e alívio da austeridade estarem a ser congeminadas, seja lá o que for congeminar, nos opacos corredores do poder dessa Europa de alguns – ou até corredores de poderes ainda mais obscuros – e que não é tangível a todos.

Queria o inquilino, que por cegueira e falta de memória crónica (e há quem defenda que peixe ajuda à memória. Não quero pensar no que seria se Portugal não fosse dos países onde se come mais peixe), o povo Português colocou em Belém, que as medidas de austeridade, essas imaginadas pela Troika e que os nossos Governantes “do costume” obedientemente levam a cabo e que aproveitam para destruir os pilares da nossa democracia saída da Revolução, tinham de ser temperadas com outro molho.

Seguramente o nosso Presidente tem presente que a comida requentada, da véspera e antevéspera, na maior parte das vezes nem muito fresca, só engana o palato quando generosamente regada de molhos que disfarçam não só o sabor mas igualmente o triste aspecto, mantendo por baixo a mixórdia.

Como co-cozinheiro da mixórdia, porém, defende longe das vistas aquilo que cozinhou, e quem o tivesse visto perorar em Jacarta (ou ouvido, ou lido aquilo que perorou) não ficaria com qualquer dúvida sobre a defesa das medidas da Troika, que fez, acrescentando que depois destas a economia portuguesa e o “ambiente” para os negócios se irão tornar mais competitivos. Isto é… as medidas de aumento de impostos, retirada de direitos sociais, apropriação dos 13º mês e subsídios de férias, precarização do trabalho, despedimentos fáceis e baratos, tudo isso que aqui o fez falar em outros temperos, é fora de portas apresentado como atractivo do tipo “venha e explore a gosto!”.

Quer o Presidente que o molho agora à mesa – uma espécie de sauce Hollandaise, graças à figura a quem agora se agarram para não serem em breve varridos do mapa – iluda mais uma vez os portugueses em relação aquilo que os mandantes cozinham e que lhes põem no prato. Tal como já uma vez fez em relação à sua criminosa política de destruição da capacidade produtiva nacional, ao tempo em que era primeiro-ministro, e cujo tempero com que foi requentada lhe permitiu ascender à mais alta magistratura da nação.

Não há erro possível. O que nos servem é mais do mesmo…e se duvidam levantem o molho e vejam o que está por baixo.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Agora como então!

foto: blog masquecena.com


"Um barril grande de vinho havia caído e quebrado-se, na rua. O acidente aconteceu na calçada mesmo à porta da taberna. O barril havia caído com a corrida, os aros tinham rebentado, e ele estava tombado despedaçado como um casca de noz. Toda a gente em redor suspendeu os seus afazeres, ou o seu ócio, para acorrer ao local e beber o vinho. As  pedras toscas e irregulares da rua, apontando para todos os lados, e concebidas, poder-se-ia pensar, expressamente para estropiar todas as criaturas que delas se aproximassem, aprisionaram-no em pequenas poças. Estas foram rodeadas, cada uma por seu grupo ou multidão, de acordo com o seu tamanho.  Alguns homens ajoelharam-se e fizeram concha com as duas mãos juntas, e sorviam ou tentavam ajudar as mulheres, que se curvavam sobre os seus ombros a sorver, antes que o vinho se tivesse esvaído todo entre os seus dedos. Outros, homens e mulheres, mergulhavam as suas malgas de louça rachada, ou até mesmo os lenços de cabeça das mulheres, que eram espermidos na boca das crianças. Outros ainda faziam pequenos diques de lama para reter o vinho à medida que corria. Alguns dirigidos por observadores nas janelas acima, tapavam aqui e ali, para deter pequenos regos de vinho que corriam em novas direcções. Outros Dedicavam-se aos pedaços encharcados e tintos do barril, lambendo e chupando os fragmentos húmidos do vinho com ávido deleite. Não houve valeta para escorrer o vinho, mas não só foi todo consumido, mas tanta lama foi consumida com ele, que quem não conhecesse o local pensaria que poderia ter passado um varredor pela rua, se por milagre tal figura ali existisse. (...) O vinho era tinto e manchou o chão da rua estreita no subúrbio de Saint Antoine, em Paris, onde se derramou. Tinha manchado muitas mãos, também, e muitos rostos, pés descalços e tamancos. As mãos dos homens que sorveram a madeira, deixaram marcas vermelhas nas cartas e as frontes das mulheres que embalavam os seus filhos estavam tingidas com a nódoa do farrapo velho que cingia de novo a sua cabeça. Os que haviam sido ávidos com os restos do barril, haviam adquirido uma mancha tigrina na boca, e um diabrete encharcado, com a cabeça de fora, mais de um saco esquálido do que de um gorro, gravava numa parede com o seu dedo mergulhado em borra de vinho - SANGUE." Charles Dickens "História em Duas Cidades"

domingo, 18 de março de 2012

Mobilidade como um direito






Partindo da definição de cidade, de Lefebvre, como uma projecção da sociedade sobre um espaço, é fácil concluir que é também o lugar dos conflitos, onde a exploração de classe se agudiza e é também contestada.
O livre e permanente acesso da população aos centros onde se encontra sediado o poder é portanto condição essencial para a alteração da correlação de forças e para a mudança da posse do poder.
Não é por acaso que o poder estabelecido procura limitar o acesso aos centros das cidades, especialmente as capitais, em horas, dias, ou ocasiões em que mais facilmente se geram relações de troca de ideias, partilha de opiniões e acção organizada das massas.
Os transportes públicos que, desde os princípios da industrialização, garantiram o acesso aos locais de trabalho, mas que com o andar dos tempos permitiram também a livre deslocação dos trabalhadores nos seus tempos livres, tornam-se assim um dos principais alvos a abater nas épocas em que os níveis de exploração e o cercear de direitos tornam potencialmente perigosas para o poder incumbente todas as manifestações e demonstrações por parte dos explorados.
Assim, a apropriação dos transportes públicos por empresas privadas não visa apenas a obtenção de um chorudo negócio à custa do Estado e dos utentes, visa também dificultar o acesso dos trabalhadores ao centro da cidade mantendo-os seguramente nas periferias, durante o tempo em que não estão em trabalho.
O minar das empresas de transportes públicos, sonegando-lhes os fundos de compensação que lhes permitiriam fazer face às necessidades de manutenção e modernização, e obrigando-as a um crescente endividamento junto da banca, fragilizou a sua actuação e foi utilizada como justificativa para reduções de oferta, degradação das condições laborais e de qualidade de serviço.
A manipulação de conceitos, apelidando de clientes o que de facto são utentes, mais não visa do que criar a ideia que as empresas de transportes públicas são de facto empresas de serviços privados actuando no mercado, procurando acomodar no intimo do publico a ideia de alegada normalidade dos aumentos de preços e opções de ditas racionalizações de serviços, com supressão de carreiras e ligações, encurtamento de horários, diminuição do número de efectivos circulantes, entre outras situações.
Ambas porém concorrem para o objectivo de criar na opinião publica as condições para prosseguir com os intentos de fundir empresas, numa primeira fase, e numa segunda privatizar as áreas cuja rentabilidade possa ser garantida per se, ou através de indemnizações compensatórias, transferindo desta maneira os fundos públicos para mãos privadas.
Da mesma forma, mesmo aqueles que se deslocam em veículos próprios vêem estando sujeitos a medidas que impedem objectivamente o acesso ao centro da cidade daqueles que têm maiores dificuldades económicas, quer através de políticas de estacionamento que em lugar de promoverem a utilização racional do espaço, fazem a apologia da troca de espaço por dinheiro, ou mais recentemente de políticas que vedam literalmente o acesso ao centro da cidade aos automóveis mais antigos, sob pretexto da defesa de melhores índices ambientais e diminuição da poluição.
Quem quer que se tenha debruçado sobre esta temática seriamente tem a noção que apenas politicas de mobilidade integradas, com uma forte componente de transporte público funcionando sob premissas de rapidez de deslocação e curtos tempos de espera, preços reduzidos, e conforto satisfatório, dá cabalmente resposta às questões de melhoria da qualidade ambiental.
Os paradigmas seguidos quer pelo Governo PSD-CDS, quer pelo Executivo PS, na Câmara de Lisboa, nada têm, nem um nem outro, qualquer orientação visando a melhoria da mobilidade e a garantia dos direitos dos cidadãos. Por isso mesmo todas as medidas apresentadas têm encontrado crescente resistência por parte das populações, tendo ou não estas a consciência clara de todas as implicações.
As comissões de utentes da Carris, que vêm aumentando em número desde as primeiras reestruturações da chamada Rede Sete, tiveram ao longo de todo este processo importantes intervenções em defesa deste modo, mas também mobilizando e esclarecendo as populações no que diz respeito aos aumentos dos preços da bilhética, de que se destacam as duas acções levadas a cabo no Caís do Sodré, no Verão de 2011, com corte do trânsito durante vários minutos, nos Olivais, com a retenção da carreira 79, na Alta de Lisboa e Ajuda, com diversas acções populares com crescente adesão popular e directa pressão sobre a Administração da Carris, nos Sapadores, Praça do Chile, Estrada de Benfica com sessões de esclarecimento e distribuição de informação.
Entre todas as acções realizadas cabe salientar a manifestação de utentes no Largo Camões, que reuniu várias centenas de pessoas em protesto por melhores transportes.
Igualmente em relação ao Metropolitano a luta levada a cabo, e na qual a intervenção do Partido foi mais determinante, passou neste pela recolha de assinaturas relativas ao não funcionamento dos meios eléctricos de acesso ao exterior e plataformas, e que impedem a circulação de pessoas com mobilidade condicionada.
Estas lutas, aliadas às lutas pela defesa dos vários outros modos de transporte público afectados, não sendo pela sua própria natureza de lutas localizadas por objectivos concretos, o veículo para travar do ponto de vista ideológico a ofensiva desencadeada, são no entanto modos de resistência, de obstrução da investida, e peças determinantes para alicerçar novas fases de luta para travar e reverter esta ofensiva.
Do ponto de vista da actuação do Partido nos órgãos autárquicos, quer na sua intervenção própria, quer no quadro da CDU, a actuação das comissões de utentes fornece elementos e dados, permite contextualizar as várias situações e, de um ponto de vista de actuação, forçar a tomadas de posição dos outros partidos que permitam a clarificação pública das suas posições ou mesmo a assumpção de posturas que abram caminho à derrota das políticas até aqui conduzidas.
As dificuldades sentidas no desenvolvimento da luta junto das populações são, não pouco frequentemente, fruto de alguma ineficiência na ligação, nos fluxos de informação e na coordenação dos membros do partido envolvidos nas várias frentes e comissões e, por vezes, da falta de uma definição clara dos diferentes níveis de actuação, sejam eles o MUSP, a Plataforma ou as várias comissões de utentes, donde seria útil um trabalho de maior proximidade entre os militantes envolvidos nas várias vertentes da luta dos utentes dos transportes públicos.
Não será uma luta que se trave sem inúmeras derrotas, mas existe uma forte hipótese de reverter a situação. Aprofundemos o trabalho!

O fascismo como reduto seguro do capital.









Durante quase todos os anos oitenta e durante boa parte dos anos 90 do século XX era usual, senão mesmo compulsório, dizer-se que a Democracia estava intimamente ligada com os valores de liberdade de escolha e igualarem-se estes à chamada livre escolha, leia-se iniciativa, e à existência do mercado, essa sacrossanta entidade cuja mão reguladora permitia que a riqueza fluísse qual cascata até toda a sociedade, uma vez acumulada nas mãos de uma pequena classe possidente.
A realidade muito rapidamente veio demonstrar que não só o mercado nada regula como a riqueza que se acumula no topo da pirâmide social não flui para lado nenhum, apenas gera maiores desigualdades e contradições dentro das sociedades.
Se dúvidas havia quanto à reprodução das desigualdades e das desvantagens sociais por via dos processos educativos e dos cuidados de saúde, com ênfase nos materno-infantis, os estudos levados a cabo no Reino Unido e cujos resultados se conhecem agora, dissiparam-nas completamente mostrando de forma meridiana que a ideia de que o capitalismo promove a mobilidade social dos indivíduos é completamente falsa, e que a vastíssima probabilidade é, que no modelo actual, quem nasce pobre e desfavorecido veja a sua situação agravar-se a ultrapassar a barreira da sua própria geração.
Historicamente, para objectar a que fossem postas em causa as premissas da dominação capitalista (e que foram retomadas no final do século passado com o desaparecimento do Bloco Socialista) o capital promoveu tanto ao nível de apoio económico como ao nível mediático, os fenómenos fascistas, nas suas várias matizes do conservadorismo social-católico, de Salazar ou Pétain, aos modelos de Mussolini ou mesmo o nazismo hitleriano.
Num momento em que a crise do sistema alastra, e em que a espoliação das populações atinge o seu paroxismo, a partir do qual qualquer nova tentativa de esbulho se irá deparar com fenómenos de resistência, mais ou menos organizada, que podem variar entre fenómenos revolucionários até à violência desesperada, com diferentes matizados entre si. O capital procura desviar as atenções, através de respostas “fáceis” e que não exigirão reflexões aturadas e devidamente respaldadas do pondo de vista teórico, promovendo a ascensão e preponderância da extrema-direita. Assim vem sendo na Grécia, onde o LAOS integrou, primeiro o governo, permitindo-lhe granjear respeitabilidade, votando contra novas medidas de austeridade depois, por forma a ganhar a simpatia de grandes camadas da população. O mesmo em França, onde a candidatura da Front National não se coíbe sequer de utilizar um discurso plagiado à esquerda. Ou mesmo a Itália onde a destruição das bases da esquerda e o desnorte ideológico abrem caminho ao apoio à direita de Fini e Bossi.
Assim é fácil verificar que dois factores concorrem para a ascensão destas forças: 1 – O desinvestimento na educação e na saúde; 2 – A promoção mediática e económica de pretensas respostas “fáceis” e imediatas.
Como ser empenhado na Democracia e Educação, enquanto fenómenos de libertação e promoção da dignidade humana, aqui estarei para juntar-me aos demais no seu combate.