sábado, 3 de setembro de 2022

Ataque à Nação Cabo-verdiana!

O passado dia 31 de Agosto de 2022 passará forçosamente à história como o dia em que o governo da nação Cabo-verdiana perpetrou um ataque sem precedentes à história, à memória e às próprias fundações ideológicas do país.
Depois da abertura de um consulado na cidade de Dakhla, Saara ocidental, aquiescendo a soberania do Reino do Marrocos sobre o território saarauí, ficou totalmente contradicto o pensamento e escrita do pai da nossa independência.
Tal como Cabo Verde, tal como a Guiné-Bissau, também os povos das colónias espanholas do Saguia-al-hamra e Rio oro, desejavam e lutavam pela sua independência. Tendo-a proclamado a 27 de Fevereiro de 1976, não muito depois da nossa própria independência.
A Marcha Verde, promovida pelo Reino do Marrocos, mais não foi que a invasão, com traços de grande barbárie, de um território alheio, com a dominação do seu povo e sem a aceitação deste.
Até hoje, e o muro construído em mais de 1300Km, a repressão atroz, a perseguição civil e cultural, a tortura, as prisões e simulacros de julgamento, a expulsão de activistas – como Aminatu Haidar -  e para culminar o episódio sangrento da invasão do acampamento de Gdeim Izik, são mostras mais do que evidentes de como a se faz a dominação marroquina do Saara ocidental e que não podem deixar de fazer ressoar na nossa memória as palavras de Cabral: O domínio “só se pode manter com uma repressão permanente e organizada da vida cultural desse povo [o povo dominado], não podendo garantir definitivamente a sua implantação a não ser pela liquidação física de parte significativa da população dominada”.
É impensável que o Governo Cabo-verdiano que apesar de todos os pesares, se reclama herdeiro do Estado erigido sobre o trabalho, dedicação e luta de Amilcar Cabral e de todos aqueles que com o seu esforço e dedicação travaram a luta armada para que nos libertássemos do jugo do colonialismo e da dominação estrangeira venha hoje agraciar outros dominantes, sobre povos que inclusive em tempos consideramos irmãos de luta, impondo-lhes uma amarga servidão.
Todos os torrões destas ilhas teriam de ter urrado de vergonha ao ver um ministro dos negócios estrangeiros do nosso país afirmar, com dócil candura, como afirmou o Dr. Rui Figueiredo Soares que o plano de autonomia marroquino é um plano credível, quando foi este mesmo país que desrespeitou a sua própria assinatura no Plano de paz com a Frente Polisário, negociado sob a égide das Nações Unidas, firmado em 1992, e que garantia o acto de auto-determinação consagrado através de referendo à população do território.
O Reino de Marrocos o que fez foi mostrar que não é um Estado digno de confiança pelas suas acções e o Estado Cabo-verdiano, ombreando lado a lado com ele, só pode cobrir de vergonha todo o cidadão que respeita a sua palavra.
Não tenho a menor dúvida que o actual Governo Cabo-verdiano, desejando mostrar, mais uma vez, a sua dedicação aos interesses económicos não se envergonha de curvar a cerviz, e romper com os compromissos que advém da sua presença nas Nações Unidas. Fica apenas por ver o que se segue, a abertura de uma embaixada em Jerusalém? A declaração de aceitação da integração dos Montes Golã em Israel?
Com a aceitação da soberania marroquina sobre o Saara ocidental, o Governo do MPD, feriu os princípios nos quais assenta a Nação Cabo-verdiana. Que linda forma de entrarmos nas comemorações dos 100 anos do nascimento de Cabral e dos 50 anos do seu assassinato. Começámos seguramente pelo fim!