domingo, 18 de março de 2012

Mobilidade como um direito






Partindo da definição de cidade, de Lefebvre, como uma projecção da sociedade sobre um espaço, é fácil concluir que é também o lugar dos conflitos, onde a exploração de classe se agudiza e é também contestada.
O livre e permanente acesso da população aos centros onde se encontra sediado o poder é portanto condição essencial para a alteração da correlação de forças e para a mudança da posse do poder.
Não é por acaso que o poder estabelecido procura limitar o acesso aos centros das cidades, especialmente as capitais, em horas, dias, ou ocasiões em que mais facilmente se geram relações de troca de ideias, partilha de opiniões e acção organizada das massas.
Os transportes públicos que, desde os princípios da industrialização, garantiram o acesso aos locais de trabalho, mas que com o andar dos tempos permitiram também a livre deslocação dos trabalhadores nos seus tempos livres, tornam-se assim um dos principais alvos a abater nas épocas em que os níveis de exploração e o cercear de direitos tornam potencialmente perigosas para o poder incumbente todas as manifestações e demonstrações por parte dos explorados.
Assim, a apropriação dos transportes públicos por empresas privadas não visa apenas a obtenção de um chorudo negócio à custa do Estado e dos utentes, visa também dificultar o acesso dos trabalhadores ao centro da cidade mantendo-os seguramente nas periferias, durante o tempo em que não estão em trabalho.
O minar das empresas de transportes públicos, sonegando-lhes os fundos de compensação que lhes permitiriam fazer face às necessidades de manutenção e modernização, e obrigando-as a um crescente endividamento junto da banca, fragilizou a sua actuação e foi utilizada como justificativa para reduções de oferta, degradação das condições laborais e de qualidade de serviço.
A manipulação de conceitos, apelidando de clientes o que de facto são utentes, mais não visa do que criar a ideia que as empresas de transportes públicas são de facto empresas de serviços privados actuando no mercado, procurando acomodar no intimo do publico a ideia de alegada normalidade dos aumentos de preços e opções de ditas racionalizações de serviços, com supressão de carreiras e ligações, encurtamento de horários, diminuição do número de efectivos circulantes, entre outras situações.
Ambas porém concorrem para o objectivo de criar na opinião publica as condições para prosseguir com os intentos de fundir empresas, numa primeira fase, e numa segunda privatizar as áreas cuja rentabilidade possa ser garantida per se, ou através de indemnizações compensatórias, transferindo desta maneira os fundos públicos para mãos privadas.
Da mesma forma, mesmo aqueles que se deslocam em veículos próprios vêem estando sujeitos a medidas que impedem objectivamente o acesso ao centro da cidade daqueles que têm maiores dificuldades económicas, quer através de políticas de estacionamento que em lugar de promoverem a utilização racional do espaço, fazem a apologia da troca de espaço por dinheiro, ou mais recentemente de políticas que vedam literalmente o acesso ao centro da cidade aos automóveis mais antigos, sob pretexto da defesa de melhores índices ambientais e diminuição da poluição.
Quem quer que se tenha debruçado sobre esta temática seriamente tem a noção que apenas politicas de mobilidade integradas, com uma forte componente de transporte público funcionando sob premissas de rapidez de deslocação e curtos tempos de espera, preços reduzidos, e conforto satisfatório, dá cabalmente resposta às questões de melhoria da qualidade ambiental.
Os paradigmas seguidos quer pelo Governo PSD-CDS, quer pelo Executivo PS, na Câmara de Lisboa, nada têm, nem um nem outro, qualquer orientação visando a melhoria da mobilidade e a garantia dos direitos dos cidadãos. Por isso mesmo todas as medidas apresentadas têm encontrado crescente resistência por parte das populações, tendo ou não estas a consciência clara de todas as implicações.
As comissões de utentes da Carris, que vêm aumentando em número desde as primeiras reestruturações da chamada Rede Sete, tiveram ao longo de todo este processo importantes intervenções em defesa deste modo, mas também mobilizando e esclarecendo as populações no que diz respeito aos aumentos dos preços da bilhética, de que se destacam as duas acções levadas a cabo no Caís do Sodré, no Verão de 2011, com corte do trânsito durante vários minutos, nos Olivais, com a retenção da carreira 79, na Alta de Lisboa e Ajuda, com diversas acções populares com crescente adesão popular e directa pressão sobre a Administração da Carris, nos Sapadores, Praça do Chile, Estrada de Benfica com sessões de esclarecimento e distribuição de informação.
Entre todas as acções realizadas cabe salientar a manifestação de utentes no Largo Camões, que reuniu várias centenas de pessoas em protesto por melhores transportes.
Igualmente em relação ao Metropolitano a luta levada a cabo, e na qual a intervenção do Partido foi mais determinante, passou neste pela recolha de assinaturas relativas ao não funcionamento dos meios eléctricos de acesso ao exterior e plataformas, e que impedem a circulação de pessoas com mobilidade condicionada.
Estas lutas, aliadas às lutas pela defesa dos vários outros modos de transporte público afectados, não sendo pela sua própria natureza de lutas localizadas por objectivos concretos, o veículo para travar do ponto de vista ideológico a ofensiva desencadeada, são no entanto modos de resistência, de obstrução da investida, e peças determinantes para alicerçar novas fases de luta para travar e reverter esta ofensiva.
Do ponto de vista da actuação do Partido nos órgãos autárquicos, quer na sua intervenção própria, quer no quadro da CDU, a actuação das comissões de utentes fornece elementos e dados, permite contextualizar as várias situações e, de um ponto de vista de actuação, forçar a tomadas de posição dos outros partidos que permitam a clarificação pública das suas posições ou mesmo a assumpção de posturas que abram caminho à derrota das políticas até aqui conduzidas.
As dificuldades sentidas no desenvolvimento da luta junto das populações são, não pouco frequentemente, fruto de alguma ineficiência na ligação, nos fluxos de informação e na coordenação dos membros do partido envolvidos nas várias frentes e comissões e, por vezes, da falta de uma definição clara dos diferentes níveis de actuação, sejam eles o MUSP, a Plataforma ou as várias comissões de utentes, donde seria útil um trabalho de maior proximidade entre os militantes envolvidos nas várias vertentes da luta dos utentes dos transportes públicos.
Não será uma luta que se trave sem inúmeras derrotas, mas existe uma forte hipótese de reverter a situação. Aprofundemos o trabalho!

O fascismo como reduto seguro do capital.









Durante quase todos os anos oitenta e durante boa parte dos anos 90 do século XX era usual, senão mesmo compulsório, dizer-se que a Democracia estava intimamente ligada com os valores de liberdade de escolha e igualarem-se estes à chamada livre escolha, leia-se iniciativa, e à existência do mercado, essa sacrossanta entidade cuja mão reguladora permitia que a riqueza fluísse qual cascata até toda a sociedade, uma vez acumulada nas mãos de uma pequena classe possidente.
A realidade muito rapidamente veio demonstrar que não só o mercado nada regula como a riqueza que se acumula no topo da pirâmide social não flui para lado nenhum, apenas gera maiores desigualdades e contradições dentro das sociedades.
Se dúvidas havia quanto à reprodução das desigualdades e das desvantagens sociais por via dos processos educativos e dos cuidados de saúde, com ênfase nos materno-infantis, os estudos levados a cabo no Reino Unido e cujos resultados se conhecem agora, dissiparam-nas completamente mostrando de forma meridiana que a ideia de que o capitalismo promove a mobilidade social dos indivíduos é completamente falsa, e que a vastíssima probabilidade é, que no modelo actual, quem nasce pobre e desfavorecido veja a sua situação agravar-se a ultrapassar a barreira da sua própria geração.
Historicamente, para objectar a que fossem postas em causa as premissas da dominação capitalista (e que foram retomadas no final do século passado com o desaparecimento do Bloco Socialista) o capital promoveu tanto ao nível de apoio económico como ao nível mediático, os fenómenos fascistas, nas suas várias matizes do conservadorismo social-católico, de Salazar ou Pétain, aos modelos de Mussolini ou mesmo o nazismo hitleriano.
Num momento em que a crise do sistema alastra, e em que a espoliação das populações atinge o seu paroxismo, a partir do qual qualquer nova tentativa de esbulho se irá deparar com fenómenos de resistência, mais ou menos organizada, que podem variar entre fenómenos revolucionários até à violência desesperada, com diferentes matizados entre si. O capital procura desviar as atenções, através de respostas “fáceis” e que não exigirão reflexões aturadas e devidamente respaldadas do pondo de vista teórico, promovendo a ascensão e preponderância da extrema-direita. Assim vem sendo na Grécia, onde o LAOS integrou, primeiro o governo, permitindo-lhe granjear respeitabilidade, votando contra novas medidas de austeridade depois, por forma a ganhar a simpatia de grandes camadas da população. O mesmo em França, onde a candidatura da Front National não se coíbe sequer de utilizar um discurso plagiado à esquerda. Ou mesmo a Itália onde a destruição das bases da esquerda e o desnorte ideológico abrem caminho ao apoio à direita de Fini e Bossi.
Assim é fácil verificar que dois factores concorrem para a ascensão destas forças: 1 – O desinvestimento na educação e na saúde; 2 – A promoção mediática e económica de pretensas respostas “fáceis” e imediatas.
Como ser empenhado na Democracia e Educação, enquanto fenómenos de libertação e promoção da dignidade humana, aqui estarei para juntar-me aos demais no seu combate.