sábado, 22 de maio de 2010

Empréstimo à Grécia - Qual a posição Marxista?

Abrindo de novo uma pequena excepção em relação à natureza deste andar, deixo a tradução de um texto ao qual cheguei via resistir, e que pode ser encontrado na sua versão original na rede marxista (na verdade trotskista). Contudo porque há muita gente que não domina a lingua inglesa, achei por bem proceder à sua tradução e publicação na integra.

Ainda que discorde da anális feita em relação aos votos no Bloco, porque acho que foram alcançados percisamente pela sua incoerência ideológica e também pelo facto óbvio desta formação política não por em causa o sistema capitalista, o que levou a que fosse apresentada, pelos meios de comunicação social, como uma alternativa de esquerda moderna e realista. Espero que seja do interesse dos leitores e também que seja muito esclarecedor sobre a natureza desta formação política.


"Um leitor de Portugal escreveu-nos a perguntar a nossa opinião sobre o voto dos deputados do BE a favor do empréstimo da União Europeia à Grécia. Na nossa opinião esta posição é escandalosa.


Hoje mesmo no Parlamento Português foi votado o apoio ao empréstimo à Grécia. O Partido Socialista votou a favor, o Partido Comunista contra. O Bloco de Esquerda votou a favor, junto com o Partido Socialista e todos os partidos de direita.


Na vossa opinião qual deveria ser a posição Marxista?

Gonçalo E.


Caro Gonçalo,


Escreve-nos reportando que o Bloco de Esquerda votou no Parlamento Português a favor do empréstimo da União Europeia à Grécia, e pedindo a nossa opinião. Conforme diz a lei permitindo a participação de Portugal no plano financeiro da EU à Grécia passou com os votos não apenas do Partido Socialista (PS), (Social Democrata), no governo, da direita, PSD e CDS-PP, mas também dos 16 deputados do Bloco de Esquerda. O Partido Comunista e Os Verdes, votaram contra. Isto veio relatado nos meios se comunicação Burgueses.


Na nossa opinião esta posição adoptada pelos membros do Bloco de Esquerda é escandalosa. Na tentativa de explicar o seu voto, Cecília Honório, a vice-presidente do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda afirmou: “Nós votaremos a favor desta proposta por nenhuma outra razão que não seja que rejeitar o empréstimo, nas presentes circunstâncias seria impor a bancarrota à Grécia, e esta seria a pior opção. Seria a política da terra queimada. Seria responder à crise com a calamidade económica, e nós não aceitamos uma política de terra queimada.” (esquerda.net)


Prosseguiu então criticando a Comissão Europeia e o FMI por impor políticas de austeridade à Grécia.


Isto é sofisma da pior espécie, não podemos separar o empréstimo à Grécia das condições que lhe estão ligadas e que foram elaboradas pelo FMI e a UE. Estas condições teriam de ser acatadas pelo Governo Grego antes que o empréstimo fosse aprovado, como é evidente para toda a gente. As condições representam o assalto completo aos trabalhadores gregos: adiamento da idade da reforma, congelamentos e cortes de salários, privatizações, aumento dos impostos indirectos, etc.


Votando a favor do empréstimo, os deputados do Bloco de Esquerda, deram de facto o seu apoio às medidas que a juventude e os trabalhadores gregos têm corajosamente combatido nas ruas e locais de trabalho com greves gerais e manifestações de massas.


Para tornar pior o cenário, no seu sumário da semana parlamentar, o membro do Bloco, José Soeiro, tenta usar outros “argumentos” para justificar a conduta do grupo parlamentar do BE. Ele começa por dizer que o empréstimo foi aprovado de forma a “impedir a bancarrota de um país massacrado por políticas liberais e vítima de um ataque especulativo por parte dos mercados financeiros e das agências de rating.”


Argumenta que “A Europa deve responder a este ataque com solidariedade. O Bloco defende a solidariedade Europeia com a Grécia, e porque estamos em solidariedade, enquanto defendemos o empréstimo, opomo-nos às condições impostas”, as quais ele correctamente descreve como “medidas draconianas contra os trabalhadores, a desagregação de serviços públicos que destruirão a economia grega”. (esquerda.net)


Este argumento é falso do princípio ao fim. “Europa” é um sinónimo para os banqueiros, os capitalistas e os seus governos que de facto controlam a Europa. A própria ideia de que esta Europa pode defender os interesses do povo grego, ou de outro país qualquer, é risível. Os banqueiros e capitalistas da Europa vão defender os seus próprios interesses e nada mais. Esperar “solidariedade” de uma Europa Capitalista é esperar peras de um ulmeiro.


Este empréstimo nada tem a ver com “solidariedade” com a Grécia contra “os mercados financeiros e agências de rating”. Com efeito, o empréstimo destina-se a proteger os interesses dos bancos, gregos e europeus, impedindo a quebra da Grécia e assegurando o retorno, precisamente aos especuladores financeiros! O dinheiro para os banqueiros será, como habitualmente, extorquido aos trabalhadores da Europa.


Num depoimento ao jornal SOL, o líder do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, explicou como a “ajuda” europeia à Grécia era importante e como deveria ser feita “em condições que ajudem os interesses europeus e os interesses das economias grega e portuguesa”. (sol.sapo.pt)


Esta é uma forma completamente errada de pôr a questão. Não existe nela um átomo de conteúdo de classe. Não existe tal coisa como “interesses europeus” ou interesses das “economias grega e portuguesa”. Devemos abordar tudo de um ponto de vista de classe. Esta crise na Grécia não tem a ver com uns malvados “mercados financeiros” e “agências de rating de crédito” a atacar a pobre “economia grega” que necessita de solidariedade da “Europa”.


Esta crise na Grécia é parte da crise geral do capitalismo e da forte recessão que ele atravessa. A classe capitalista, na Grécia, a nível da Europa e mundial, quer fazer a classe trabalhadora pagar o preço da crise, através de cortes salariais, ataques aos padrões de vida, privatização e cortes em serviços públicos, etc. De um lado estão os interesses dos trabalhadores gregos, europeus e de todo o mundo, do outro os interesses dos capitalistas e banqueiros gregos, europeus e de todo o mundo. Estes são mutuamente irreconciliáveis.


Se se abandonar um ponto de vista de classe, rapidamente se resvala para o campo da classe dominante e se acabará por apoiar a solução dos capitalistas gregos e europeus a expensas dos trabalhadores gregos, neste caso. Isto é perigoso porque amanhã os mesmos argumentos podem ser avançados para justificar medidas de austeridade em Portugal a coberto do “interesse Nacional”.


Os deputados do Partido Comunista no Parlamento português, votaram contra o empréstimo da EU. Isto foi correcto. O líder do grupo parlamentar Comunista, Bernardino Soares, explicou que o que está a ser proposto para a Grécia e “uma dose enorme da mesma política, com congelamento de salários e pensões, a destruição de direitos e privatizações”.


Disse que não votariam a favor da implementação de medidas para a Grécia, às quais se opunham em Portugal. O Governo do Partido Socialista está com efeito a propor um pretenso “Programa de Estabilidade e Crescimento” (PEC) o qual é um brutal pacote de medidas de austeridade, destinadas de novo a fazer os trabalhadores suportar o encargo da crise. Como se pode votar o empréstimo da EU à Grécia (que está condicionado à aplicação de medidas de austeridade) e opor-se às mesmas medidas em Portugal?


O que torna o voto dos 16 deputados do Bloco ainda mais criminoso, é o facto de que a lei que torna possível o empréstimo à Grécia teria passado sem os seus votos. Não havia real necessidade do seu voto favorável, excepto a pressão da opinião pública burguesa e a sua própria confusão ideológica.


E quanto ao argumento que a alternativa a este empréstimo seria a bancarrota da Grécia? Qual a alternativa? A verdade é que não há alternativa dentro dos limites do capitalismo. Se se aceita o sistema capitalista, é se forçado a aceitar com ele todas as consequências. Mas há uma alternativa. Antes de mais não deveria haver cortes nas condições de trabalho ou nos salários de trabalhadores e pensionistas gregos, nem cortes nos serviços públicos. Os bancos e as grandes companhias deveriam ser nacionalizados e os seus recursos colocados sob controlo democrático dos trabalhadores, e utilizados em benefício do povo trabalhador grego e não dos banqueiros (gregos e europeus).


Alguns podem argumentar que isto não e uma política “realista”, mas o que há de “realista” nas políticas dos lideres do Bloco? Ao votar pelas políticas do FMI e da EU contra os trabalhadores gregos, fizeram um favor aos capitalistas e seus representantes na Europa. Isto pode ter o aplauso da burguesia e direita, mas seguramente haverá muitos membros do Bloco de Esquerda que ficarão desapontados e furiosos.


Muitos dos líderes e deputados do Bloco pertencem à Associação para uma Política Socialista Revolucionária (APSR), que organiza os apoiantes da Mandelita “IV Internacional” em Portugal. Uma política socialista revolucionária exigiria que eles votassem contra o empréstimo à Grécia, não a favor. Sentimo-nos no direito de lhes perguntar ao que estão a brincar?


O BE duplicou o número de deputados nas últimas eleições, porque dezenas de milhares de jovens e trabalhadores viram o Bloco como uma alternativa de esquerda. Muitos dos que votaram no Bloco consideram-se socialistas e revolucionários. Eles não votaram no BE para que este votasse juntamente com a direita legislação reaccionária. Deveriam pedir contas aos seus membros no Parlamento.


Saudações Camaradas
Jorge Martin
Tendência Marxista Internacional"

4 comentários:

Joseph disse...

Sem dúvida.
O BE, ao votar com o PS e com a Direita, por mais argumentos que invoque, apoia as medidas de «socorro» dos liberais europeistas, designadamente os alemães, que até preconizam a venda das ilhas ou hipoteca destas, está em sintonia com os desígnios dos predadores capitalistas que mais não pretendem do que «castrar a virilidade» dos patriotas gregos que se opõem a esta insidiosa dominação: subjugar.

JB

Anónimo disse...

è a grande diferença. Uns quérem mudar a sociedade, uma nova sociedade sem explorados e exploradores, o fim do capital (PCP). Os outros quérem gerir e comer no capital, quérem as migalhas (BE).
Leão

Carlos Moura disse...

Há um provérbio tão antigo quanto os Evangelhos, de onde aliás provém, que diz que: "Pelos seus frutos, os conhecereis". O Bloco com os frutos que produz e bem claramente apresenta deixa-se conhecer como força do sistema e não por um novo sistema.
É claro com água.
Abraços JB e Leão

Joseph disse...

Amigo Carlos:

Observa este interessante vídeo pois, desde o princípio ao fim é extraordinário.

Um abraço para ti e para o Leão...

JB
http://brevissimas.blogspot.com/