sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

As chamas de Dresden



Á luz do contexto da IIª Guerra Mundial o bombardeamento de Dresden, de que se comemoram amanhã 65 anos, pode ser entendido exactamente como o justificaram as forças aliadas, como forma de baixar o moral da população alemã e a levar a não resistir ou pelo menos não apoiar activamente o governo nazi, e o seu esforço de guerra. Porém este brutal bombardeamento, que só será ultrapassado em dimensão pelo de Hiroshima, foi de facto uma carnificina de uma população civil numa cidade que o que possuía de importância administrativa, histórica e cultural, carecia de importância estratégica e militar.

O facto de a população alemã apoiar maioritariamente o partido nazi, e o Reich, não podia só por si justificar o ataque. Do ponto de vista simbólico cidades havia nas quais o apoio e cenografia nazista eram bem mais evidentes, basta pensar em Nuremberga ou em Munique. Sede e berço, respectivamente dos congressos e surgimento do partido de Hitler.

Estou em crer que aquando do bombardeamento de Dresden, era já evidente a derrocada da Alemanha nazi, e era também evidente que esta cidade ficaria situada na zona de ocupação soviética, donde o bombardeamento não visava apenas aterrorizar a população alemã, visava também criar uma situação de catástrofe humanitária e económica com a qual as autoridades de ocupação haveriam de ter de se defrontar mais tarde.

Matar assim de uma assentada dois coelhos, justificou, o suficiente, as forças anglo-americanas, para que quase sem interrupção durante dois dias fossem despejadas centenas de milhares de bombas, cujo calor transformou em gesso as pedras calcárias de igrejas e monumentos.

Na noite de 13 de Fevereiro cerca de 700-800 bombardeiros britânicos despejaram 3.000 bombas de alto teor explosivo. O mesmo número de aviões, num segundo ataque, descarregou 500.000 pequenas bombas incendiárias com o objectivo de incendiar os prédios já danificados e as condutas de gás rotas.

As altas temperaturas dos incêndios provocaram um efeito de tempestade de fogo que varreu a cidade, matando por sufocamento e dificultando o socorro às vítimas.

O número oficial de mortos foi de 35.000 o que é totalmente irrealista, dados os muitos refugiados, principalmente da Silésia, que estavam abrigados na cidade. Com base em dados e análises no pós-guerra, este número pode ser hoje calculado entre 150.000 e 300.000 pessoas. Podemos imaginar as condições horríveis em que morreram.

Este crime de guerra, pois que de outra coisa não se tratou, não vem diminuir ou justificar as atrocidades do regime nazi, nem vem diminuir ou justificar outros actos de barbárie decorridos durante este conflito, mas vem lembrar, como talvez muitos gostassem de esquecer ou apagar, que a acção da Grã-Bretanha e dos Estados Unidos na guerra teve muito pouco de impoluto do que a historiografia e cinematografia nos vêm impondo há mais de 50 anos, responsabilizando sistematicamente a União Soviética pelo terror infringido à população alemã nos términos do conflito.

A sucessiva mobilização de neofascistas e neonazis, na comemoração deste acontecimento, é fruto da incapacidade dos partidos democratas burgueses em lidar com a situação, porque fazê-lo significaria reconhecer que aqueles que apresentam como exemplo de uma guerra “limpa” e que conduziu à génese da actual República Federal, estão afinal maculados por crimes de guerra, e, se calhar bem mais graves dos que são atribuídos aos soviéticos “bolchevistas”. Deixa-se assim espaço a que a extrema direita capitalize junto da população, o que do seu ponto de vista é bem melhor.

Os democratas antifascistas, que muitas das vezes estão realmente empenhados numa mudança (pese embora com análises e métodos que pouco se alicerçam na realidade e objectivo histórico de superação do capitalismo), acabam no meio disto sendo ferramentas dóceis do capital e contribuir assim para justificar e alicerçar o prestígio fascista nas camadas de classe média e desta forma ao seu crescimento eleitoral e de influência.

Era necessário, de uma vez por todas, que o acto bárbaro de Dresden fosse estudado, analisado e que a população de Dresden, da Alemanha, e do Mundo ficasse ciente dos acontecimentos e dos actos. De outra forma estaremos todos sujeitos a arder também nós nas chamas desta cidade.

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