Originalmente no Registo
Quando uma conversa lhe desagrada por o seu interlocutor estar descaradamente a mentir, ou no mínimo a tentar passar-lhe a perna, diz a minha mãe normalmente em resposta: “o meu ouvido não é chiqueiro”. Assim estou eu nos últimos dias de cada vez que oiço na televisão ou na rádio, ou leio nos jornais, as tiradas relativas à imperativa necessidade do PEC, especialmente no que diz respeito à diminuição de salários, pensões e regalias sociais, acompanhados de um aumento de impostos.
Falar em congelamento salarial, quando de facto se fala na perda de poder de compra, é no mínimo estar a gozar com as pessoas. Desde o longínquo ano de 76, só por duas vezes os aumentos de salários foram superiores à taxa de inflação, o que significa que a redução real dos salários tem sido a prática comum em Portugal qualquer que fosse a massa corporal das vacas. Donde abrir a boca para propor agravar esta tendência deveria ser considerado no campo da indecência e não da governação.
Na mesma senda, tendo os níveis de pensões que temos, em que grande parte dos nossos idosos ou das pessoas que por incapacidade estão diminuídas no seu desempenho se encontram abaixo dos limiares de pobreza, falar do congelamento das suas pensões deveria envergonhar até à lividez qualquer Ministro ou Secretário de Estado dignos desse cargo, especialmente face às sumptuosas benesses oferecidas a qualquer bicho-careta que vindo da estranja se disponha a arranjar um canto com umas maquinetas a fim de produzir não sei o quê, até não sei quando e que, na maioria das vezes vai embora com benesses e sem produzir o que quer que seja.
Falar em aumentar impostos, directos e indirectos, a uma população que está já com a corda na garanta é de uma hipocrisia absoluta. Especialmente uma população que tanto que se endividou para adquirir um padrão de vida e conforto minimamente aceitável, já que o que ganhava não chegava. E não venham com histórias dos bens de consumo, porque quem se endividou não os procurou sozinho e além disso para quem tanto fala em mercado, o que seria do mercado interno se assim não fosse?
Já agora, não me falem e poupança, ou não percebem ainda que quem tem de viver, sempre com menor salário ao longo de trinta anos, não pode nem tem condições de poupar o que quer que seja? Ou onde pensavam que as pessoas iam buscar o dinheiro para poupar? Nas árvores? No mar? Desenganem-se. Com as políticas que vieram a seguir nos últimos nos em relação à Política Agrícola Comum ou à Política Comum de Pescas, nem num lado nem no outro é possível retirar um só euro que seja.
Esperar que as pessoas aceitem quietas e contentes a imoralidade da isenção de maioria de impostos a bancos e ganhos de mais-valias, quando estas instituições têm à vista de todos lucros brutais, não querendo nunca participar na divisão de custos de um estado funcional, mas querendo receber sempre do estado quando estão em maus lençóis, deixando claro que os nossos governantes tremem de medo de enfrentar esta gente, preferindo impor-se aos que menos podem, é seguramente do campo do temerário ou do louco.
Portanto não me venham com conversas que o meu ouvido não é chiqueiro. Querem fazer quem crer que as pessoas vão aceitar e assistir passivamente enquanto o pouco que a sua vida tinha vai ruindo, enquanto banqueiros e gestores vão mantendo as suas prebendas? Até quando vão fazendo sondagens, aqui ou na Grécia, ou seja onde for, dizendo que todos se foram submetendo à necessidade imperiosa de ficar sem nada? Querem enganar quem?
2 comentários:
Hello! Carlos
Parece-nos que lá para a Grécia o povo não está pelos ajustes de aceitar que "quanto o mar bate na rocha quem se lixa é o mexilhão".Movimentam-se e reagem.
Um abraço para ti.
JB
Esperemos que aqu tb não
Abraço grande
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