sábado, 21 de novembro de 2009

A Revolução Russa e o futuro da humanidade

Este é um pequeno texto de reflexão a propósito do aniversário da Revolução de Outubro (7 de Novembro). Escolhi publicá-lo penas hoje, porque era parte integrante de uma intervenção e entendi por bem não o tornar público antes da mesma. Espero que apreciem, e já agora comentem, porque opiniões sem contraditório não são um processo dialéctico.



No transcorrer destes vinte anos da destruição do bloco socialista, em que a um dado momento pareceu que esta alternativa para a humanidade iria soçobrar, muitas foram as reacções, sentimentos e questões que se levantaram nas mentes de todos quantos observavam, analisavam, seguiam os desenvolvimentos dos países socialistas e advogavam essa via como única forma de avançar para o futuro.

Em 99, questionado sobre os dez anos da queda do Muro, lembro-me de ter respondido que primeiramente fui invadido por um sentimento de tristeza, ao ver desaparecer uma força que simbolizava um contraponto às tentativas de hegemonia capitalista a nível global, e posteriormente, ao contactar com pessoas vindas desses países, esse sentimento ter dado lugar a uma nova análise e observação da forma como esses povos começavam a olhar o seu próprio passado e a ter noção das perdas reais que tinham sofrido.

O estabelecimento de um Estado dos trabalhadores não começou com a Revolução Russa, começou com a Comuna de Paris e o próprio Lenine não acreditava, de início, que a duração do poder dos sovietes se prolongasse mais do que essa primeira experiência operária, tendo dançado em público no dia em que a jovem República soviética ultrapassou a sua duração.

Contudo a tenacidade e determinação dos povos, em conjunto com um contexto internacional que limitou as capacidades de intervenção das potências capitalistas, ainda que esta tenha existido e sido de clara influência na reacção que conduziu à Guerra Civil nos anos subsequentes à revolução, conduziu a que em lugar de setenta dias tivéssemos assistido a 74 anos, em que toda a humanidade beneficiou do enorme avanço civilizacional que a Revolução Russa iniciou.

É evidente que ao o estabelecimento deste processo revolucionário não é alheio a formulação teórica de Marx e Engels, não sendo, também, despicienda a análise crítica do desenvolvimento e práticas da Comuna de Paris. Análise que, devidamente contextualizada poderia ter evitado o desastre dos Spartakistas de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, alicerçando mais cedo o desenvolvimento do socialismo em solo alemão e alterando dramaticamente a dinâmica histórica.

Conquistas bem reais da humanidade, que se chamaram pleno emprego, educação de bom nível, cultura, desporto, férias e cuidados de saúde acessíveis a todos, habitação garantida a baixo preço, criminalidade baixa, segurança da existência, espírito de solidariedade na vida quotidiana, não teriam sido usufruídos pelos povos se não se tivesse verificado a alteração da posse dos meios de produção, como se verificou na URSS.

Ao longo do século vinte, e inspiradas pela realidade de que era possível a construção de um Estado de trabalhadores, mesmo nos países capitalistas, foram obtidas vitórias civilizacionais importantíssimas, como as oito horas de trabalho, as férias pagas, o décimo terceiro mês ou a semana-inglesa.

A derrota do nazismo e do fascismo, ideologias que, defendendo a desigualdade dos seres humanos baseados em factores raciais e culturais, estruturavam a sua proposta de sociedade na existência de elites cultivadas, face a uma imensa massa de homens e mulheres, a quem a única função admitida na vida era trabalhar, permitiu não só fortalecer essas conquistas como ampliá-las aos cuidados de saúde universal, à assistência materno-infantil ou à segurança social.

Hoje, ao retrospectivarem esses anos em que a ciência e técnica foram colocadas aos serviço dos povos, em áreas tão diversas como a energia, a biologia, a medicina, ou mesmo a conquista espacial, os trabalhadores, os camponeses, os reformados dos então chamados países de Leste, que viveram e avaliaram no seu quotidiano, a restauração capitalista mascarada de «democratização», sem ter esquecido as contradições e desvios em relação aos aspectos ideológicos, fazem um balanço positivo do que foi o socialismo por comparação com os fenómenos de pauperização galopante das massas, face ao enriquecimento fabuloso de máfias e de agentes económicos externos a expensas dos seus recursos e aparelho produtivo. Aí estão os estudos e sondagens, que mesmo procurando iludir e disfarçar a realidade não a podem de todo em todo esconder.

Face à crise que, bem ao contrário do que se apregoa, é fruto natural do funcionamento do capitalismo; Face ao enorme retrocesso da humanidade, como um todo, em termos dos direitos sociais e laborais, como o direito ao emprego, à educação, à alimentação e ao alojamento condigno, indicadores essenciais da concretização e elevação da condição humana; Face ainda à degradação ambiental crescente, com a apropriação privada de recursos tão essenciais à vida, como a energia ou a água. Resulta bem claro que as experiências socialistas foram, e são ainda hoje, fonte de inspiração e de ensinamentos essenciais para alicerçar novas experiências e pedra basilar nas lutas que a humanidade terá que travar nos tempos mais próximos.

Pensar que se podem construir novas experiências socialistas, durem elas 70 dias, ou 70 e mais anos, sem ter em conta o manancial de conhecimentos, tentativas, práticas, vitórias e derrotas que historicamente marcam a construção do socialismo; Supor que delas podemos fazer tábua rasa, para nos concentrarmos em meras causas imediatas, que pese embora possam mitigar as situações mais gritantes provocadas pelo capitalismo, não conferem aos povos alterações substanciais às condições da sua existência, é um enorme retrocesso nas lutas por um futuro mais humano e digno para todos.

A construção do socialismo é um imperativo de classe, mas também, por todas as implicações que a emancipação dos trabalhadores comporta, é, ao mesmo tempo um imperativo humano. Donde é necessário prosseguir a todo o tempo a luta, mesmo nos momentos em que as adversidades sejam profundas e aparentemente intransponíveis. Esses são os momentos em que importa retirar ilações da história e sermos capazes de traçar os caminhos para esse futuro.

A Revolução Russa é portanto matéria de estudo e reflexão, mas ao mesmo tempo memória e celebração das capacidades transformadoras dos povos, uma vez libertos das situações de exploração e envolvidos directamente no processo, que não pode deixar de ser dialéctico e participado, de construção do Socialismo.


Soube, entretanto, que o meu bom amigo, camarada, leitor dete blog e que por vezes nos dá a alegria e honra de partilhar as suas opiniões através de comentário, Leão se encontra doente e hospitalizado. Para ele o meu grande abraço solidário, para que prontamente se restabeleça e que possamos ter por aqui o soar dos seus rugidos.

3 comentários:

Joseph disse...

Amigo Carlos

Sem dúvida que a transformação revolucionária da sociedade humana é feita por fases visto constituir um autêntico processo, com avanços e refluxos mais ou menos duradouros.
Experimentam-se na Europa , na América ou na Ásia. em África e muito em breve na Oceania porque a globalização não vai perdoar e a classe operária tem a última palavra a dizer e terá que agir.
O propalado colapso da URSS é uma amostra de um recuo que surgiu com a «letargia» de gente muito convencida dos «benefícios do capitalismo» e que está a sofrer os seus nocivos efeitos.
Marx e Engels não eram russos e Fidel e Ho Chi Min também não...
Lá chegará o Dia que será «for ever»...em todo o Mundo.
O nosso camarada Leão está melhor.Telefonei-lhe hoje.
Brevemente regressa à Luta!

Um Abraço.
JB

Carlos Moura disse...

Olá obrigado pelo teu comentário. Claro que concordo que muito ainda está por fazer, e que como e óbvio a próxima evolução poderá vir de muitos locais diferentes. Felizmente a Russia não é um "Nec Plus Ultra" da Revolução, nem tampouco a Almanha de Marx, Engels, Rosa Luxemburgo ou Liebknecht, ou a França de Lafarge ou Jaurès. Náo quer dizer que os avanços ou recuos aí náo deixem de ser importantes tanto social como históricamente.
Folgo que o Leão esteja melhor.
Abraço

Anónimo disse...

Estou de volta amigo! E mesmo tendo passado tanto tempo sobre este teu escrito julgo ainda ir a tempo de um comentário.
É claro que andámos para trás, mesmo muito para trás -Mais guerras, mais exploração, mais desemprego, menos direitos e MENOS LIBERDADE.
Mas aprendemos e vamos descobrindo como o inimigo trabalhou. Hoje sabemos que o inimigo é muito, muito falso - sorri, fala bem, oferece imagens maravilhosas da vida - mas mente, mente muito, deturpa e manipula as consciencias.
A luta é difícil, mas continua e continuará sempre até à VITÓRIA FINAL do SOCIALISMO do COMUNISMO únicas alternativas .
Relembro Maiakowski no seu poema; ORDEM nº2 ao EXÉRCITO da ARTE, parte final.

Já não há imbecis
para, multidão boquiaberta,
esperar que caia dos lábios do «mestre» uma palavra.
Camaradas
inventai uma arte nova
que arranque
a República da lama .

abração amigo de Leão .