Sobre temas actuais eis mais um artigo dos que publiquei no Registo. Prometo iniciar o mês de Dezembro com um texto original.
Longe vai o tempo em que por falta de quantidades suficientes deste liquido em Lisboa, os Aguadeiros Galegos vinham à cidade satisfazendo a sede daqueles que o podiam pagar, trazendo água das regiões limítrofes da cidade. Os tempos passaram e felizmente chegamos enquanto sociedade ao entendimento que a água é um bem público que não pode depender da capacidade económica de cada um, e como bem essencial que é tem de estar disponível a todos a preços que, cobrindo algumas etapas da sua captação, tratamento e distribuição, não signifiquem uma limitação para ninguém.
As sucessivas normativas da água, cujo mais recente desenvolvimento foi o decreto-lei 194/2009, têm vindo sempre no sentido contrário a este entendimento, agravando custos e procurando activamente criar condições para colocar nas mãos de concessionários privados a gestão deste recurso e da sua distribuição. Pese embora se reconheça a possibilidade da gestão directa, a verdade é que se tratou de um diploma todo ele concebido para a concessão a entidades privadas deste aspecto fundamental para a vida das populações.
Muitos, entre eles gestores, autarcas, e até ambientalistas, têm aplaudido estas medidas baseados no pressuposto que este tipo de gestão aproximaria os preços ao consumidor, aos custos da obtenção, contribuindo para uma poupança e gestão mais racional, entrando-se numa óptica de utilizador-pagador. Nada poderia estar mais distante da realidade. Logo de início porque o acesso á água não pode ser condicionado pelo bolso do utente, todos, independentemente do seu poder económico têm de ter direito a água e a uma boa qualidade desta, donde é responsabilidade do Estado e dos Municípios garantir esse acesso, partindo da contribuição comum gerada pelos impostos para a cobertura dessas necessidades.
Por outro lado a gestão privada lucra precisamente no aumento do consumo, tanto mais quanto mais escasso for o recurso e portanto maior o seu preço de mercado, donde não é de forma nenhuma descartável que os maiores consumidores venham a ter benesses e facilidades em detrimento do pequeno consumidor doméstico, coisa que aliás já se verifica em outros mercados.
Num local onde o bem já é escasso e a sua qualidade deficiente, em que quer as captações, quer os tratamentos atinjam valores bastante elevados, é fácil de ver o resultado. Se por acréscimo a população tiver um rendimento abaixo da média nacional, como no caso do Alentejo, então a situação poderá atingir foros de drama.
O facto de não ter sido assinado o protocolo entre as Águas de Portugal e um conjunto de sete municípios alentejanos, entre os quais se encontra Évora, não pode deixar de ser considerado positivo para a população do concelho e do Distrito. Mas por quanto mais tempo se irá manter esta postura, dado que os responsáveis autárquicos desta cidade já mais que deram mostras de ter intenção de assiná-lo, dizendo algo eufemísticamente tratar-se de um protocolo de intenções. É profundamente preocupante o norte (ou falta dele) que as políticas sociais vão tomando neste Concelho e no País, nomeadamente quando se trata do recurso de água.
Porque, com efeito, em lugar de termos um serviço universal de acesso à água de qualidade, corremos o risco é de termos os novos aguadeiros.
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