quinta-feira, 17 de março de 2011

Que força é essa?


Este artigo foi publicado no jornal O Registo É uma opinião crítica sobre as evoluções nesta última semana do protesto chamdo da Geração à Rasca, e de outros acontecimentos políticos. É certo que a minha visão desta geração e do seu protesto, não obstante reconheça toda a justeza e justiça das suas reivindicações, se prende em muito com a muita demagogia que se desenvolve em torno deste fenómeno: O apelo ao fim da "classe política", como se os partidos não fossem associações emanantes da sociedade, constituidos por pessoas que se associaram em torno de projectos de sociedade diversos; A insistência em falar de "sociedade cívil", quando civis somos todos, fora os militares e não me consta que exista a menor sombra de tomada do poder pela sociedade castrense; A culpabilização de partidos e deputados, quando estes mesmos que portestam há muito se afastaram das decisões no país e permitiram com a sua inércia e descaso as situações evoluirem até ao ponto de apodrecimento; A recalcitrante preocupação com o acessório, tal como os custos de um Parlamento ou de Municipios e Freguesias, que podem escolher e monitorizar, e em último caso substituir, e que desempenham uma função social importantíssima, em detrimento dos gabinetes das Comissões de Coordenação Regional e dos Governos Cívis, que são por nomeação governamental e escapam ao controlo da população, mas que no entanto saem caríssimos ao erário público. São estes os motivos pelos quais me questiono profundamente qual o ponto de chegada deste movimento que, contrariamente a todos os outros protestos, obteve dos meios de comunicação, esses mesmos que sendo pertença dos grandes grupos económicos vão filtrando a informação que chega à população, o maior destaque, com direito a páginas e páginas de jornais nos dias anteriores, de directos das várias televiões no próprio dia e de ecos das suas acções, sendo alcandorados a voz maior da contestação até em relação às palavras do Presidente da República. Questiono-me para onde vai este movimento e qual o seu ponto de chegada, se não se organizar e souber identificar qual ou quais os seus adversários nesta luta e os seus aliados, ou mesmo aqueles, que apesar do seu desinteresse e até hostilidade, têm ao longo destes anos sido as suas vozes e defesa última dos seus interesses enquanto individuos numa sociedade.

É essa a reflexão que fiz no Registo, e é essa reflexão que vos deixo agora:



"Os acontecimentos destes dias parecem marcados por sinais muito diversos em que a única coisa que parece falhar é a direcção para onde vamos a despeito desses sinais. O discurso de tomada de posse do Presidente, o novo pacote de medidas de austeridade, a discussão da moção de censura, a manifestação da chamada geração “à rasca”, são todos eles sinais do apodrecimento do sistema político à mão de interesses que se mantiveram inalterados ao longo dos anos, maugrado as transformações do pós 25 de Abril, e que hoje se encontram protegidos pelos ditames da União Europeia, eles próprios servos dos que vão acumulando os recursos do planeta sob formas diversas.
O apelo à juventude proferido pelo Presidente, na tomada de posse, torna-se um eco tão vazio, quanto o apelo para o aproveitamento das potencialidades do mar o foi, nas palavras de um homem que, quando em responsabilidades governativas, foi parte activa na degradação do ensino público com ênfase no superior, quando proliferaram universidades privadas e politécnicos, que exploraram alunos e famílias que para aí foram atirados via “numerus clausus”, que foi parte activa na expansão do fenómeno da precarização e expansão dos falsos recibos verdes, da consolidação dos contratos a prazo, entre outros feitos.
Como se coloca em contraponto às acções do Governo, um Presidente que não só sanciona como aprofundaria todos os aspectos mais negativos desta governação, se ele próprio ou o partido de onde provém governassem? E é bom de ver que nem sequer fazem desse facto segredo, admitindo-o e fazendo gala disso mesmo?
E onde se coloca um Governo e o partido que o sustenta quando semanas após fazer juras que nada mais há por onde cortar e, logo após encontros havidos na estranja, anunciam criar novos contribuições a pagar, desta feita pelos reformados? Que já não governa de facto, limitando-se a ser o fiel administrador das directrizes vindas de fora.
Que já só se limita a tentar manter as franjas de poder que garantam à sua clientela a manutenção das suas mordomias.
De acordo com os efeitos da moção que foi debatida no dia 10, aparentemente mantêm-se no mesmo lugar. Uma moção tem de servir para um objectivo e esse objectivo não pode deixar de ser a substituição do Governo. Não pode nem deve servir para pavonear algumas tiradas de oratória, por muito que o assunto dessa oratória seja meritório de acordo na maior parte dos pontos. Uma moção de censura tem de procurar aglutinar o máximo de vontades, ainda que não possa deixar de se nortear pelas acções que censura.
Fosse essa a postura e, por muito que à direita não conviesse, estaríamos hoje a debater como potenciar na melhor votação possível o justo descontentamento dos cidadãos e quais as hipóteses de uma correlação de forças que travasse as políticas de direita, mesmo que esta viesse a obter uma maioria relativa.
Para onde ir com uma Manifestação cujo Manifesto aparece como um somatório de protestos e descontentamentos, apelando para que alguém, supondo-se os mesmos de que se queixam, faça alguma coisa, mas não dizendo ao certo o quê.
Os jovens queixam-se de que a sua geração, a mais bem preparada da história, não encontra forma de realizar as suas aspirações e desenvolver as suas capacidades, contribuindo para a produção do país. Reconhecem que se alhearam durante muito tempo, o que é positivo, mas colocam no mesmo rol dos que consideram responsáveis pela situação, aqueles que se opuseram, não só sem o seu apoio mas por vezes com a sua indiferença e até boicote, às políticas que conduziram à destruição do aparelho produtivo, da investigação, à degradação do sistema de ensino e principalmente à perda de direitos sociais e laborais, alvos maiores do seu descontentamento.
Apelam a alguém, mas rejeitam o sistema político. Querem substituí-lo por algo, mas pelo quê? Porventura os representantes não são políticos? Não são políticas as suas reivindicações e preconizações? E mesmo as suas afirmações de tão ajuramentado apoliticismo? Rejeitam estes porque foram responsáveis da situação em que se encontram? E rejeitam os outros porquê? Porque lhes disseram que eram gente má e criminosa, que nada faz e se quer locupletar com o que afanosamente amealharam… Não viram, não sabem, nem tampouco quiseram saber quem de facto são e o que propõem, mas estão já à partida dispostos a descartá-los só porque lhes dizem que sim. Para onde vão? Para onde os viu já a história ir na longínqua década de 30 do século passado?
Qualquer alteração da ordem política que não seja também da ordem económica, nada vai mudar. Pode num momento ou noutro galvanizar alguns grupos, até mesmo a maioria, na culpabilização e perseguição activa de outros grupos sociais, sejam eles autóctones ou estrangeiros. Pode recobrir-se de engrandecimento e preservação cultural, ou por outro lado apresentar-se como uma “libertação” das potencialidades do individuo em relação ao Estado, dissimulando que o Estado é o conjunto do território, da sua população, das suas realizações e património, donde propriedade de todos e o seu Governo um mero mandatário da soberania do povo, tal como está consagrado constitucionalmente.
“Precários nos quiseram, Rebeldes nos terão”, mas de que serve ser-se ou afirmar-se rebelde perante as orientações e as leis altamente lesivas da dignidade do cidadão e do trabalhador, se não houver coragem e rebeldia suficientes para romper com as teias e a poeira de anos de preconceito e se ousar realmente exigir “um mundo novo a sério”? A justeza e a seriedade do sentimento da “geração à rasca” não estão em causa. O que está em causa é a capacidade e a clarividência de formular reivindicações, de lutar pelas mesmas e de apoiar e se aliar aqueles que durante muitas décadas enfrentaram os mais duros combates e mais aviltantes das condenações e penas para criar as condições em que a dignidade do homem, também como ente produtivo, se sobreponha à lógica de medir todas as coisas e pessoas por um valor de mercado."

2 comentários:

CDU Belém disse...

Amigo e Camarada Carlos!

Parabéns pela continuação dos teus «posts» nesse tão lutador Blogue.
Força !
O nosso Blogue CDU em Belém também deveria ficar bem na tua lista de blogues...

Um abraço.
JB

Carlos Moura disse...

Concerteza...falha minha :) Vou tomar já providências