sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Cuidado. Que pode o povo querer um mundo novo a sério


Os acontecimentos dos últimos dias mostram, de forma inequívoca, a falência do sistema até do ponto de vista moral. Analisados os diversos acontecimentos verificamos que, passados menos de 40 anos da Revolução de Abril, há quem esteja entregue a actividades financeiras que parceram completamente afastadas do nosso universo naqueles primeiros anos, quem nas altas esferas se permite estar permanentemente mal informado, não fazendo jus ao salário que ganha, quem se proponha corrigir o país, segundo a sua visão, abolindo o regime democrático, e quem não se coíba de determinar aos seus subordinados quais as notícias que devem ser dadas e em que termos.
Não é de espantar, os sucessivos governos constitucionais têm sido os fiés serventuários não do povo, pelo qual foram eleitos, mas dos interesses económicos, quer nacionais quer estrangeiros.
Os nossos governantes acabadas as suas funções governativas retiram-se não raramente para as empresas que, de forma curiosa, sairam grandemente beneficiadas durante os seus consulados. É claro que todas estas situações, publicas e notórias, não passam de meras coincidências dado que os nossos governantes estão acima de qualquer suspeita.
Os desmandos que praticaram, como hoje se sabe em relação ao BPN, praticaram-nos seguramente apenas após terem cessado funções, porque antes não tinham sido tocados por uma espécie de mal que dá aos responsáveis que deixam funções.
Para os que se mantêm em funções, como os que têm funções de fiscalização, a mazela mais comum é uma espécie de privação de sentidos que os torna incapazes de cumprir funções e os torna absolutamente desconhecedores da realidade, dos sinais que se avolumavam ao longo de anos e perfeitamente amnésicos em relação aos avisos que lhes foram sendo transmitidos. Aparentemente por zelo e apego à causa pública nunca abandonaram as funções por baixa médica, nem se demitiram por incapacidade física. A dedicação destes homens é assombrosa e deveria ser merecedora de uma menção honrosa, senão mesmo uma condecoração.
Quando está já tudo a rebentar pelas custuras, sem que se vislumbre uma saída airosa para a falência cívica e moral do regime do neo-rotativismo, uma dirigente partidária, mais do que conotada com um período em que boa parte desta gente prosperou, lembra-se de propor a suspensão da democracia, para poder governar. Não deve causar espanto. Na verdade no estretor da Monarquia constitucional, ou seja no rotativismo entre Hintze Ribeiro e Luciano de Castro, também o Rei D. Carlos se lembrou de chamar João Franco para numa ditadura impor uma "corrigenda" ao estado, corrigenda que o povo não queria.
Na verdade o que estas corrigendas permitem, como permitiram na altura é que tudo mude para que tudo se mantenha. Mas não se julgue que esta escolha é esclusiva desta senhora, o actual governo é useiro e vezeiro em interferir quer na divulgação, quer no teor e forma de apresentação das notícias, como ficou mais uma vez evidente no recente caso da Lusa. Aquilo que não é do interesse daqueles a quem serve não deve aparecer ou, se tiver de aparecer, que o seja de forma a que o poder saia favorecido. No fundo uma espécie de fotografia retocada onde as rugas e defeitos são cuidadosamente retirados.
A história, dizia Marx, repete-se. Primeiro como uma tragédia, depois como uma farsa. A verdade é que os jogos de interesses são uma farsa que sufoca o desenvolvimento do país e a satisfação das necessidades da sua população. Quem nos vêm desgovernando tem alma e coragem de apontar como generosos os subsídios de desemprego, esquecendo o insulto que é as mais do que generosas remunerações e outras prebendas que recebem, principalmente quando as recebem do fundo comum que são os impostos cobrados à população. Tem alma e coragem de prometer aberturas de empreendimentos durante décadas, que depois duram apenas o tempo em que desses empreendimentos os patrões retiram lucros churudos. Tem alma e coragem de procurar desactivar serviços e institutos mais do que necesários a fim de vender com vista à especulação os terrenos que ocupam. Tem alma e coragem de estrangular os sistemas de ensino público quando do aumento das qualificações reais do nosso povo depende o futuro do país.
Quem nos desgoverna, escarnece do passado e de todos quantos lutaram para que o nosso povo gozasse de um real desenvolvimento, sufoca o presente malbarantando as capacidades, quer produtivas, quer de investigação, lancando o nosso povo numa espiral de exploração e endividamento, cujos resultados ainda estão largamente por vislumbrar, hipoteca o futuro do país em favor de interesses que são estranhos ao nosso povo, aumentando o fosso social e provocando a transferencia de riqueza para o capital que, em muitos casos só por conveniencia é nominalmente nacional.
Situações destas exigem de facto soluções radicais. Radicais sim, mas democráticas, com decisões tomadas com transparência, participadas e construídas a partir da base com o povo e não contra este. Só uma actuação deste tipo pode sanear a política nacional e acabar com as teias de interesses obscuros e danosos para o país.

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