sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

O regresso de Prometeu



Os acontecimentos últimos por toda a Grécia não são, ao contrário do que os meios de comunicação nos querem fazer crer, incidentes históricamente desgarrados e com contornos que apenas enviesadamente são ideológicos. Na verdade o mal estar na sociedade grega é antigo, mais antigo do que a guerra cívil, mas em que o resultado desta deixou de profundas feridas sociais, com cidadãos de primeira e outros primeiro presos em campos de concentração e depois ostracizados durante décadas bem como toda a sua descendência. Esta fractura na sociedade grega provocada pela tentativa de acabar, de uma vez por todas, com a influência e prestígio do Partido Comunista Helénico (KKE), permaneceu durante todo o periodo monárquico (monárquicos, apoiados pelo Reino unido, com quem a guerra cívil foi travada), agudizou-se de novo sob a ditadura dos Coroneis, à qual os Comunistas oposeram tenaz resistência, e embora mitigada, continuou a atravessar a sociedade grega da República inquinando os próprios fundamentos da mesma.

As oligarquias dominantes, quer da Nova Democracia (creio que seria mas correcto chamar-lhe Nova República, dado a tradução da palavra do grego para o português permitir as duas interpretações), quer do Partido Socialista Pan-Helénico (PASOK), nunca fizeram mais do que assegurar o poder para a sua clientela, descurando as necessidades das populações a todos os níveis, permitindo a desertificação humana em larga escala, a corrupção nos serviços desde a administração ao saneamento, passando pela segurança, de que são exemplos mais marcantes a óbvia incapacidade de lidar com os incêncios de 2007 e a atitude beligerante e agressiva da polícia em grande parte fruto das suas próprias frustrações sociais, da falta de reais meios de actuação significativa e do baixo moral entre os seus elementos.



As desigualdades, falta de oportunidades e perspectivas de futuro, aliadas a um descernimento ideológico muito incipiente, fruto de um sistema de ensino que procura combater activamete a capacidade de análise, crítica e acção dos jovens, foram o alfobre ideal para a gestação de uma luta desenquadrada, ou fracamente enquadrada, politicamente que, se tem muito de justo tem de igual modo uma falta de consequência nos objectivos, permitindo que assim que se esgote a revolta não exista um potêncial revolucionário para alavancar uma alteração radical do status quo.

É neste aspecto que há urgência em orientar politicamente esta revolta dotando-a de principios ideológicos coerentes que possam permitir a estes jovens perspectivarem uma saída para a situação, sendo que esta saída não pode ser nenhuma que lhes não dê respostas, porque se isso acontecer as condições ora criadas não vão desaparecer e de tempos a tempos assistir-se-á à libertação de uma fúria incontrolada e algo acéfala, que não permite a libertação de um esforço para a construção de uma sociedade melhor.

Prometeu, roubou o fogo aos Deuses para dar aos Homens, mas porque ninguém liberta os oprimidos se estes não se libertarem a eles mesmos, têm de ser os Homens a aprender a utilizar esse fogo. Queimar o Olimpo só, não chega!

6 comentários:

Anónimo disse...

Amigo!

Li este teu escrito com a música de José Mario Branco feita em tempos que já lá vão há muito, como som de fundo . Daqui resultou que lembrando outros tempos e outra lutas lá na Grécia contra os coronéis e aqui em Portugal contra os generais da brigada do reumático,escutei MIKIS THEODORAKIS e reforcei este sentimento de que vamos vencer mais uma batalha, lá e cá .

Leão

Anónimo disse...

Ainda dando continuidade ao anterior, acho importante leres o Diario Info, discurso da secret. geral do KKE ( Partido Comunista Grego )e a nota dos editores .

Abração.

Anónimo disse...

Amigos

É pertinente este artigo e sugestivo o seu título.
A Razão não pode permanecer constantemente oprimida e este fenómeno social, da contestação, sujeita a elevadas condições de "pressão e temperatura" tem um limite...
Tanto lá como cá...
A Revolução germina, cresce,floresce e frutifica!
Obra do Povo e para o Povo!

Um abração

J.C.

Carlos Moura disse...

Fiquei emocionado com os vossos comentários. A luta é realmente até à vitória final. Com Mikis Theodorakis acho que seria uma vitória final.
É claro que vou ler já o Diário info.
Abraços grandes aos dois

SP disse...

Carlos,

todos juntos e separados por palavras brancas também confio que será assim!

Um abraço... peludo!

Carlos Moura disse...

Bem...eu não sei se serão palavras brancas. Parece-me que elas serão vermelhas por vários motivos.
Costumo dizer que os possidentes nunca entregarão o poder e os previlégios de bom grado, daí que lhe tenham de ser retirados. O certo é que de uma forma ou de outra o entregarão, pois quando alguém usufrui de um previlégio é um direito que falta a alguém algures. E esse direito tem de ser restituído.
Abraço