quinta-feira, 21 de agosto de 2008

A Andorinha



Ainda que esta entrada tenha o nome de andorinha nada tem a ver com esta espécie de aves, ainda que aprecie muito a sua presença nos beirais, dos quais vem sendo desalojada por força de uma humanidade que não só não sabe conviver com os animais, como coloca o interesse imediato da aparencia imaculada das suas fachadas acima de interesses muito mais importantes que são os equilibrios naturais. Mas de facto não é esse o tama desta entrada.

Chamei-lhe a andorinha, porque finalmente com a conquista de uma medalha de ouro, parecem ter-se recomposto os anímos e serenado as tempestades em que se ameaçavam transformar a lusa participação em Pequim.

Subitamente tudo volta a ser flores, estamos satisfeitos nos nossos pátrios orgulhos e não mais se discutirá quais as razões da nossa fraca prestação desportiva. Alías nem sequer há grande coisa para discutir, uma vez que já tudo está identificado. Quem lê-se alguns jornais, nos últimos dias, saberia que 90% dos estabelecimentos de ensino tem desporto escolar, e que é este que permite a competição dos futuros atletas; Que um esforço enorme foi feito, por esse país fora, na construção de polidesportivos; Que foram gastos M€ 14,00, pasme-se, nestes quatro anos de preparação olímpica; E que o contrato entre o Governo e o COP previa os resultados em quantificação de medalhas.

Se não fosse trágico seria cómico, e seria cómico porque mal se lê que o desporto escolar são o futsal e o voleibol (quando é), que os encontros entre colectividades estão a morrer, que não existe qualquer investimento nas modalidades amadoras, que os Clubes, como o Clube Naval de Lisboa que apoia o Remo e a Vela, têm condições deploráveis, que o Estádio Nacional, casa por excelência do desporto, está hoje cercado de urbanizações e que novas se adivinham (comendo mesmo parte dos estacionamentos que poderiam ter revertido para novas áreas desportivas), que os seus circuitos de manutenção são hoje uma memória do passado, e que os únicos investimentos feitos nos últimos anos têm sido no Ténis, com a finalidade de aí localizar o Estoril Open, e pouco mais. Não se diz também que os polidesportivos desse país são na sua maioria mal construídos, com písos improprios para outra coisa que não seja uns jogos de "futebol", que a maioria não permite disputa de desporto federado. Acresce ainda que as Escolas Secundárias e Básicas deste país muitas delas não tem ginásios, não têm balneários com água quente, piscinas nem pensar (e as que existem muitas vezes municipais não estão preparadas para prática desportiva, e quando estão são vitimas de desaproveitamento, degradação, e demolição, como é o caso dos Olivais em Lisboa, com a piscina de 50 metros e a de saltos para a água), juntem-se aqui muitos Campus Universitários em que o desporto não foi sequer tido em conta.

Poderia continuar aqui a fazer um relambório de mazelas, mas não vale a pena. Lembraria só que os 14 milhões de euros, pagam a fortuna de mil euros ao mês aos desportistas, do qual tem de sair o dinheiro para alimentação, estadia fora do local de residência habitual, transportes e material. Muito gostaria eu de saber como é que eles conseguem, e não me espanta nada os abandonos após os Jogos (esperemos a bem do desporto nacional que sejam só reacções a quente). E isto, meus caros, não abranje todos os nossos desportistas, apenas os considerados de elite.

Sabendo-se que a qualidade, como em quase todas as actividades humanas, vem da quantidade de praticantes e qua a excelência vem do apuramento da qualidade (e não de uma qualquer fantasia governamental de centros dessa coisa), seria por aí que havia de começar, estimulando e fomentando a prática do desporto amador, triando os valores que começassem a aparecer e dai formando-os e apostando fortemente na sua preparação.

Como estamos, temos valores que aparecem descobertos por alguém com maior cuidado e empenho, desenvolvidos com grandes esforços pessoais, e afirmando-se com uma dose superior de teimosia e sofrimento. Assim quando algum ganha alguma medalha, era isso que devia ser lembrado e não usado como remendo para a nudez do rei. Por mais merecida que seja, e foi-o, não devemos deixar o brilhante feito do Nélson ou da Vanessa, cegar-nos a ponto de vermos uma primavera feita apenas por escassas andorinhas.

A todos os nossos representantes em Pequim agreço o esforço, o trabalho, o sofrimento, o empenho que colocaram ao longo destes anos, nos quais trabalharam para garantir uma presença nos Jogos Olímpicos, contra todas as adversidades existentes num país que espera sempre muito mais do que as condições que garante permitem. São e serão sempre lembrados por terem honrado o país, quer tenham ou não medalhas. MUITO OBRIGADO.

1 comentário:

SP disse...

Bonita reflexão com uma andorinha pelo meio...

Um abraço.